Título: Governo põe mais R$ 50 bi no cofre
Autor: Lu Aiko Otta; Fernandes, Adriana
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/07/2008, Economia, p. B7

Dinheiro reforça o `colchão de liquidez¿ que garante o pagamento da dívida pública mesmo durante crises

O governo vai reforçar em R$ 50 bilhões o ¿colchão de liquidez¿ que garante o pagamento da dívida pública. Normalmente, esse colchão contém perto de R$ 100 bilhões e garante que os títulos da dívida emitidos pelo Tesouro Nacional sejam resgatados em sua data de vencimento mesmo no pior dos cenários, em que o nervosismo seja tamanho que não se consiga emitir um único título novo. Essa garantia dura três meses.

O valor extra será garantido pela Medida Provisória 435, editada no fim de junho, que permite ao governo utilizar para o pagamento da dívida o chamado superávit financeiro. Esse superávit corresponde a recursos arrecadados com finalidades específicas - por exemplo, taxas para investir em aeroportos, estradas federais e fiscalização de serviços públicos - que não foram utilizados no ano passado. A sobra, que chega aos R$ 50 bilhões, poderá ser usada para reduzir a dívida pública.

Esses recursos adicionais vão ajudar o Tesouro Nacional a manter a dívida dentro das metas fixadas no Plano Anual de Financiamento (PAF), disse, ao Estado, o secretário-adjunto do Tesouro Nacional Paulo Valle.

O nervosismo no mercado financeiro e a aceleração da inflação são fatores que dificultam aos administradores da dívida pública atingir objetivos mais ambiciosos, como, por exemplo, diminuir fortemente a participação de papéis corrigidos pela taxa de juros básica (Selic) na composição do estoque do endividamento. Em tempos de crise, esses papéis, chamados Letras Financeiras do Tesouro (LFT), são os preferidos do mercado financeiro.

No entanto, se não é possível perseguir os objetivos mais otimistas, ainda é possível manter a dívida dentro dos limites fixados no PAF. O programa tem metas mínimas e máximas e, no momento, o Tesouro opera na ¿banda conservadora¿, disse Valle. Por exemplo: o PAF determina que o estoque da dívida deverá encerrar o ano entre R$ 1,48 trilhão e 1,54 trilhão. Os administradores trabalham agora com o limite mais alto.

Valle garantiu, no entanto, que a MP 435 não foi editada por causa da crise. ¿Isso é uma prática comum na administração pública¿, afirmou. Ele ressaltou que essa mesma operação já foi realizada em 2006.

Comparada com 2002, quando o Brasil atravessou uma de suas piores crises de confiança, a situação atual é ¿confortável¿, garantiu Paulo Valle. Naquela época, a principal forma de o Tesouro obter recursos para se financiar era emitir LFTs de prazos curtos, como três e seis meses. Agora, o Tesouro tem conseguido emitir títulos com remuneração prefixada (determinada na hora do leilão e não corrigida pela variação dos juros como as LFT) com prazo de até dez anos.

A compra de títulos por investidores estrangeiros continua em alta. Em janeiro deste ano, eles detinham 4,96% do total da dívida federal em títulos. Em maio, a participação havia subido para 6,2%.

Valle admite que nos últimos cinco meses o apetite pelas LFTs aumentou, enquanto a demanda pelos títulos prefixados caiu - um movimento típico de momentos de crise. Ainda assim, o Tesouro tem conseguido não aumentar o volume de LFTs no mercado. Em vez disso, o governo vem utilizando o superávit fiscal (diferença positiva entre receitas e despesas) para resgatar parte da dívida. Os R$ 50 bilhões do superávit financeiro também poderão ser utilizados com essa finalidade.

¿Hoje temos mais flexibilidade¿, disse Valle. ¿Acho que, ao lado das políticas fiscal e monetária, a administração da dívida é outro dos fundamentos positivos do Brasil, que mostram que o País está sólido para enfrentar períodos de maior incerteza.¿