Título: Brasil está por trás da crise em Doha
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/07/2008, Economia, p. B1

O comissário de Comércio da União Européia, Peter Mandelson, atribuiu ontem ao Brasil as dificuldades nas negociações para a Rodada Doha, da Organização Mundial do Comércio (OMC): ¿O Brasil sempre está por trás¿. Para Mandelson, o Brasil precisa assumir novas responsabilidades no comércio internacional diante do seu status de potência emergente, e não apenas pressionar pelas concessões dos países ricos.

O recado do comissário foi dado às vésperas do início da negociação final da Rodada Doha. Ontem, ministros de todo o mundo desembarcaram em Genebra para as reuniões que marcarão a conclusão das negociações. Mas, à noite, já surgiu a primeira crise, com os países latino-americanos recusando-se a aceitar um acordo sobre o comércio de bananas.

¿Os países desenvolvidos estão se adaptando à nova realidade criada pelo surgimento das economias emergentes. Mas essas economias precisam também entender que devem assumir responsabilidades que antes não tinham¿, disse Mandelson ao Estado.

Em outras palavras, o comissário europeu insiste que está na hora de Brasil, Índia e China também pagarem por terem benefícios no comércio internacional. Por anos, a diplomacia brasileira alegou que a atual Rodada foi convocada na realidade para corrigir distorções no mercado internacional, principalmente na agricultura.

O comissário europeu, criticado pelo presidente francês, Nicolas Sarkozy, por ter feito concessões aos emergentes sem contrapartida, insinua ainda que a UE não está distante da posição americana em relação aos subsídios agrícolas.

Mandelson deixa claro que não haverá concessão no setor agrícola sem pagamento. A exigência dos países ricos é de que os cortes de tarifas para bens industriais sejam de cerca de 63% e o número de produtos sensíveis seja mantido limitado. O Brasil já alertou que, na atual proposta, setores como têxteis teriam corte de mais de 30% nas tarifas de importação.

BANANA

Mandelson deixou claro ainda que está preocupado com o fato de os países latino-americanos e a UE não chegarem a um acordo sobre a abertura do mercado europeu para bananas. Na noite de ontem, Equador e um grupo de exportadores de bananas recusaram um acordo sobre tarifas de importação na Europa, que previa uma queda nas barreiras nos próximos sete anos. Para os latino-americanos, não é suficiente.

Depois de horas de debates, o representante da UE abandonou a sala dizendo que a proposta feita pela própria OMC era a palavra final. ¿Os países latino-americanos estão dificultando a situação¿, disse Mandelson. Entre os países da região, a Colômbia foi a única a aceitar um acordo. Os demais, liderados pelo Equador, insistiram em continuar negociando.