Título: Para PF, Greenhalgh fez lobby por compra da Brasil Telecom pela Oi
Autor: Macedo, Fausto; Godoy, Marcelo; Cruz, Renato
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/07/2008, Nacional, p. A4
Negócio de R$ 13 bi poderia render comissão recorde; desafio era conseguir alterar Plano Geral de Outorgas
O advogado e ex-deputado Luiz Eduardo Greenhalgh foi contratado pelo banqueiro Daniel Dantas, do Grupo Opportunity, para fazer lobby no governo com o objetivo de tornar viável a compra da Brasil Telecom pela Oi, suspeita a Polícia Federal. Segundo a investigação, a criação da supertele, um negócio de R$ 13 bilhões, poderia render aos lobistas de Dantas uma comissão recorde pelo serviço. O principal nó da questão era conseguir que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) alterasse o Plano Geral de Outorgas (PGO) do setor, proibindo que uma mesma operadora controlasse mais de uma das áreas de telefonia fixa, definidas na privatização do setor, nos anos 90.
Além de Greenhalgh, o banqueiro teria usado os serviços do publicitário Guilherme Sodré, o Guiga, para obter apoio no Congresso e no governo para a operação. No relatório final do inquérito sobre a Operação Satiagraha, o delegado Protógenes Queiroz afirma que a atuação dos dois será alvo de um novo inquérito, a ser instaurado - eles tiveram a prisão temporária negada pela Justiça.
Desencadeada há 16 dias, a Satiagraha levou à prisão 18 pessoas - além de Dantas, foram detidos o investidor Naji Nahas, o ex-prefeito Celso Pitta, empresários e doleiros envolvidos em suposto esquema de desvio de recursos públicos, evasão de divisas, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
Relatório de interceptação telefônica feito por Protógenes aponta uma ligação entre Greenhalgh e o executivo Humberto José da Rocha Braz como um dos principais indícios de lobby na fusão das teles. O diálogo ocorreu em 26 de março e durou 12 minutos. A conversa gira em torno da negociação para o fechamento da venda da BrT.
Braz - um dos acusados de oferecer US$ 1 milhão ao delegado Vitor Hugo Ferreira para livrar Dantas e parentes do inquérito Satiagraha - conta detalhes da negociação entre a BrT e o Citibank e fala em valores. Diz que o negócio é de US$ 260 milhões e a discordância entre o Citi e o Opportunity para fechar o negócio é de 0,3% do total. O problema seria o valor da Telemig Celular, que também seria vendida. Braz diz que o destino de um terço da empresa, avaliado em US$ 100 milhões, podia ser decidido em arbitragem. E conta a resistência do Opportunity em submeter o caso à arbitragem.
DILMA PRESSIONADA
Treze dias antes, às 10h14, Greenhalgh havia relatado ao lobista Sodré seus esforços para se aproximar da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, a fim de tratar da fusão. O advogado diz ter recebido um recado da petista, de que ela não queria falar mais sobre o assunto. A alegação: "O governo já se meteu demais sobre este assunto." Greenhalgh conta que tentou ainda encontrá-la em solenidade oficial, mas ela teria cancelado a ida ao evento, depois que soube da sua presença no local.
Outro problema relatado pelo grupo para a mudança do PGO era a suposta resistência do relator da matéria na Anatel, o conselheiro Pedro Jaime Ziller. Em telefonema interceptado em 5 de junho, Dantas conversa com Sodré. Este diz que quem criava problema era Ziller. "Enquanto não renovarem o mandato dele, ele não aprova", diz Sodré ao banqueiro.
O Estado procurou Ziller, que, por meio de sua assessoria, afirmou que não se manifestaria. Em junho, ele apresentou o relatório com as mudanças no PGO, aprovadas por unanimidade na Anatel. As alterações abriram caminho para a compra da BrT pela Oi. O mandato de Ziller acaba em novembro, e ainda não foi definido se ele permanecerá ou não no cargo.
O suposto lobby de Greenhalgh estendia-se ao PT. Ali, o advogado defendia a "reabilitação" de Dantas. Em conversa com Sigmaringa Seixas, ex-deputado do PT no Distrito Federal, ele diz que, "se fosse no tempo da União Soviética", seria necessário reabilitar "o cara", como ocorria com dissidentes mandados à Sibéria pelo regime comunista. E garante que o banqueiro estava mudando de vida.
?ACHISMO?
A conversa de Greenhalgh com Braz sobre os valores da venda da BrT para a Oi foi alvo de análise da PF. Em relatório, um agente menciona a possibilidade de os US$ 260 milhões citados por Braz serem valores referentes à remuneração do lobby e levanta a hipótese de que o dinheiro seria usado como caixa 2 em campanha eleitoral, mas não apresenta outro indício que fundamente a suspeita. Greenhalgh, por nota, e Braz, por meio de seu advogado, negaram essa hipótese, que trataram como fruto de "achismo" e "má-fé".
Ao Estado, Greenhalgh disse, na nota: "O diálogo, para qualquer pessoa, mostra que há uma negociação em curso, mas só mesmo a visão deturpada do doutor Protógenes pode visualizar os interlocutores como lobistas". Seu trabalho consistiu em analisar processos envolvendo o Opportunity, nas áreas civil e criminal. "Ajudei a conformar as propostas que foram exaustivamente debatidas entre as partes, até o acordo final. Advoguei. A negociação que resultou na criação da BrOi, foi árdua, longa, tensa, mas não teve nenhum ilícito."
O advogado de Braz, Renato de Moraes, afirmou que não conhece os áudios da investigação. "O Humberto é um executivo há mais de 20 anos, é pessoa séria e, de fato, participou da negociação da Brasil Telecom", declarou. Segundo Moraes, normalmente a transcrição dos diálogos feita pela PF não corresponde ao conteúdo fidedigno do áudio. "É interpretação subjetiva, achismo da autoridade."