Título: Blindagem a advogado deve ter veto
Autor: Mendes, Vannildo; Nossa, Leonêncio
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/07/2008, Nacional, p. A8

Para Tarso, prerrogativas da classe devem ser preservadas ?sem que isso interfira na luta contra a impunidade?

Depois de conversar pela manhã com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro da Justiça, Tarso Genro, deu ontem sinais claros de que vai sugerir o veto ao projeto de lei, aprovado pelo Congresso Nacional, que amplia a inviolabilidade dos escritórios de advogados e os torna praticamente imunes às investigações da polícia e do Ministério Público. "As prerrogativas dos advogados têm de ser respeitadas, como parte do Estado de Direito, mas sem que isso interfira na luta do País contra a impunidade", disse Tarso.

Ele deu a declaração após receber, de um grupo de dirigentes de entidades representativas de juízes, procuradores e delegados de polícia, nota técnica recomendando "veto total" ao projeto. Caso sancionada, a medida "inviabiliza a persecução penal" nas investigações que envolvam advogados e torna "substancialmente mais fácil para criminosos fazer uso dos seus escritórios", diz a nota.

O governo tem até 11 de agosto para definir o que fazer com o projeto. "Não chegamos a uma conclusão definitiva, mas a contribuição de vocês é relevante", disse Tarso aos dirigentes. Segundo o ministro, no fundo, "a luta é contra a impunidade no País".

A importância do veto ao projeto também foi debatida por Lula na reunião com os ministros da coordenação política, pela manhã, no Palácio do Planalto. O grupo avaliou que o governo não sofrerá desgastes políticos ao rejeitar a proposta, como pretendem o presidente e o ministro da Justiça, apesar da forte pressão de entidades formadas por advogados, capitaneadas pela OAB. "Não podemos tornar os escritórios de advogados mais invioláveis do que a casa dos cidadãos", afirmou o presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), José Carlos Consenzo.

Para Consenzo, o projeto "não é bom para os advogados, para o Estado de Direito e para os cidadãos em geral". "Só traz benefícios para os maus advogados", completou Fernando Mattos, presidente da Associação Nacional dos Juízes Federais (Ajufe). "Todos têm de ser iguais perante a lei, não vemos por que criar imunidade absoluta para advogados. Isso significa impunidade."

A decisão de vetar o projeto já havia sido tomada há mais de duas semanas, quando a proposta nem sequer tinha sido votada no Senado. Valeram os argumentos de Tarso e de especialistas do direito de que o projeto é um risco até mesmo para os advogados, que estariam mais expostos e poderiam se tornar reféns do crime organizado. A inviolabilidade, na forma proposta, tornaria os escritórios áreas seguras para os bandidos.

Na última sexta-feira, durante viagem a Portugal, Lula sinalizou numa entrevista que iria vetar o projeto. Ele sugeriu que a proposta criaria uma exceção, privilegiando a classe de advogados.

Durante a reunião da coordenação política, o presidente ouviu os argumentos de Tarso e obteve seu compromisso de que dialogará com a OAB para evitar conflitos institucionais. Segundo o ministro, há três fatores a serem considerados na questão. "O primeiro é o respeito às prerrogativas dos advogados, que são de toda a cidadania", enfatizou. "O segundo é se a norma proposta milita em favor da impunidade ou não, e o terceiro aspecto é que uma lei, além da força normativa, tem de ter um caráter educativo."

Aprovado em 11 de julho no Senado, o projeto altera o Estatuto da OAB. Caso seja transformado em lei, o escritório de advogado passa a ser inviolável. Ou seja, não mais poderá ser alvo de busca e apreensão, mesmo que por ordem judicial, salvo quando o próprio advogado for o investigado pela prática do crime.