Título: Fazenda vê risco de PIB abaixo dos 4%
Autor: Lu Aiko Otta; Graner, Fabio
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/07/2008, Economia, p. B8

Avaliação é de que alta do juro em 0,75 ponto pode ter sido exagerada

A pancada de 0,75 ponto porcentual de alta na taxa de juros acendeu um alerta no Ministério da Fazenda. O temor é de que a dose tenha sido exagerada e derrube o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2009 para algo entre 4% e 4,5% ou até menos. Na visão dos auxiliares do ministro da Fazenda, Guido Mantega, corre-se o risco de interrupção indesejada no ciclo de crescimento sustentado da economia.

Apesar da preocupação, Guido Mantega não veio a público criticar a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom). Ele vem se mantendo longe da imprensa, ao contrário do que ocorria nas outras ocasiões em que o Banco Central (BC) decidiu a Selic. Mantega costumava dar declarações para tentar pressionar por juros menores.

Agora, a estratégia é diferente. O ministro e seus auxiliares entendem que a definição dos juros é responsabilidade do presidente do BC, Henrique Meirelles. Também será dele a tarefa de prestar contas no futuro, caso o crescimento seja ferido de morte pelas taxas elevadas.

Uma atitude mais comedida de Mantega é também vista nos bastidores como uma conseqüência dos sinais inequívocos de apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Meirelles. Em entrevista à revista Exame no início do mês, Lula deixou claro que concordaria com um eventual aumento dos juros, se necessário, desde que tudo fosse discutido com antecedência. De fato, Meirelles esteve com Lula na véspera do Copom.

¿A equação é simples¿, comentou o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves. ¿Eleição depende mais de inflação do que de emprego.¿ Em outras palavras, ele acredita que Lula não quer enfrentar uma inflação elevada em 2010, ano eleitoral. Para isso, concorda até reduzir o ritmo do crescimento econômico e da geração de empregos.

O apoio de Lula a Meirelles tampouco indica desprestígio de Guido Mantega, segundo assessores palacianos. ¿Esses boatos de enfraquecimento do ministro ocorrem a cada 45 dias¿, comentou um deles.

O Copom se reúne a cada 45 dias e não é segredo que, por Mantega, os juros jamais subiriam. A principal preocupação do ministro é não desanimar os empresários que pretendem investir. Com isso, quer preservar o ciclo de crescimento.

O Copom não está alheio a essa preocupação de Mantega, segundo o ex-diretor do Banco Central Carlos Thadeu de Freitas, atualmente economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC).

¿No comunicado (do Copom), eles disseram que vão agir tempestivamente para colocar a inflação no centro da meta¿, comentou. ¿Houve uma certa precipitação em mostrar que o ajuste será curto e haverá um período favorável em 2009, de forma que quem estiver investindo pode continuar.¿ Ele acrescentou que esse sinal pode ter sido fruto de decisão política e foi ¿infeliz¿, pois banco central nenhum do mundo pode se comprometer com duração ou intensidade de alta de juros.

Para Freitas, o BC foi contraditório ao elevar os juros de um lado e, de outro, tentar não desanimar os investimentos. Ele observou que os juros longos, que influenciam o crédito, caíram da casa dos 15% antes do Copom para 14,73% na sexta-feira. Com isso, explicou, o crediário pode se aquecer em vez de esfriar. Dessa forma, será mais difícil conter o consumo e a alta dos preços. Ou seja, o BC teria dado um tiro no próprio pé.

ESTOURO DA META

Mesmo com a alta de 0,75 ponto porcentual na taxa de juros, a inflação deste ano deverá superar os 6,5%, estourando o limite de tolerância da meta. ¿Não tem como a inflação de 2008 ficar abaixo de 6,5%¿, afirmou Gonçalves, do Fator. Ele observou que este ano, na média, a inflação ficou em 0,6% a cada mês. Se a partir de julho caísse para 0,45%, ainda assim chegaria ao fim do ano em 6,6%, ou seja, acima da meta.

Segundo ele, a queda da inflação nos próximos meses é improvável. ¿Existe muita gordura nos preços do atacado para ser repassada ao varejo.¿ Além disso, é dada como certa a elevação do preço dos combustíveis após as eleições, com impacto nas taxas de novembro e dezembro. Para julho, ele espera que a inflação fique em 0,58%. Este ano, pelas projeções do Fator, a inflação ficará em 6,7%.