Título: Partidos devem filtrar inidôneos
Autor: Recondo, Felipe
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/08/2008, Nacional, p. A12

Para Lewandowski, queixa contra `fichas-sujas¿ deve agora ser encaminhada ao Congresso, instituição que pode rever a lei

Depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) derrotou a tese de que candidatos com ficha suja deveriam ser barrados pela Justiça Eleitoral, o ministro Ricardo Lewandowski afirma que eventuais reclamações da população devem ser dirigidas ao Congresso. São os deputados e senadores que podem alterar a lei complementar que estabelece os critérios para que um político possa se candidatar. ¿O Supremo e o Poder Judiciário como um todo compartilham da preocupação que tem a população de barrar os candidatos inidôneos. Mas esse reclamo tem de ser dirigido ao Congresso¿, afirma o ministro, nesta entrevista ao Estado.

Como o sr. imagina que a opinião pública recebeu a decisão do STF de liberar os fichas-sujas?

O Supremo não tinha alternativa senão cumprir a Constituição e a lei. Foi praticamente uma interpretação linear. O Supremo e o Judiciário como um todo compartilham da preocupação que tem a população de barrar os candidatos inidôneos. Mas esse reclamo tem de ser dirigido ao Congresso. É ele que pode, eventualmente até deve, alterar a lei complementar.

O Congresso poderia barrar candidatos com problemas na Justiça?

Acho que o Congresso, como representante da soberania, teria ampla discricionariedade para estabelecer um critério. O que é preciso é que haja um critério objetivo. Hoje temos esse critério, que é o trânsito em julgado dos processos. O que não me parece desejável e causaria maior perplexidade na população seria essa multiplicidade de critérios. Ora um juiz poderia considerar inidôneo alguém que tivesse uma denúncia aceita, ora outro juiz consideraria uma condenação em primeira instância.

E agora, a quem cabe barrar esses políticos?

A tarefa principal é dos partidos. Eles podem e devem filtrar os candidatos inidôneos.

E se os partidos não fizerem isso?

Passado esse filtro dos partidos, é necessário que o cidadão faça uma boa escolha. Por isso, não me oponho a que essas informações (da vida pregressa dos candidatos) sejam amplamente divulgadas.

O sr. pensa que a lista dos fichas-sujas é correta?

Eu diria que a própria Justiça Eleitoral deveria divulgar essas informações, que são públicas. Esse era o desejo do presidente do TSE, ministro Carlos Ayres Britto, mas não havia condições técnicas para isso. É possível que no futuro a Justiça Eleitoral ponha à disposição dos eleitores a vida pregressa dos candidatos.

O sr. apresentou dados no julgamento de mudanças de decisões das primeiras instâncias no STF. Pode explicar essas informações?

Eu fiz um levantamento prévio e procurei saber, na área criminal, qual era o número de recursos extraordinários providos e desprovidos. E cheguei a números que impressionam. Se somarmos os recursos providos integralmente e os providos em parte, chegamos à conclusão de que praticamente um terço das decisões das instâncias inferiores é reformado de alguma forma e um quarto é totalmente reformado. Isso significa que um em cada quatro candidatos eventualmente barrados pelos juízes por serem considerados fichas-sujas seria reabilitado no futuro pelo Supremo, mas depois de já passadas as eleições.

Isso significa que estariam injustamente barrados?

Significa que estariam cerceando direito fundamental de uma pessoa de participar na vida política, de ser votado, de ser eleito. Muitos fazem uma comparação com a exigência de atestado de vida pregressa impoluta para fins de serviço público, mas isso me parece uma comparação um tanto equivocada, porque, quando se trata de direitos políticos, falamos de um direito fundamental, de um direito e do dever do cidadão de participar da gestão da coisa pública. Concurso, ao contrário, faz quem quer.