Título: O objetivo é correto, a forma é errada
Autor: Lima, Kelly
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/08/2008, Economia, p. B5

Segundo consultor, receitas do governo podem ser maximizadas dentro da legislação atual do setor

Nicola Pamplona

Para o consultor David Zylbersztajn, a legislação atual poderia garantir ao governo maior arrecadação com a receita do petróleo do pré-sal, como quer o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ex-diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Zylbersztajn comandou os primeiros leilões de áreas petrolíferas no Brasil, com a atração das grandes multinacionais do setor. Hoje, crê que o processo foi bem sucedido e teme que uma discussão sobre o tema no Congresso paralise os investimentos na busca por novas reservas no País. ¿Ninguém sabe quanto tempo pode durar e o que vai sair desse debate¿, afirma.

O sr. acha que a Lei do Petróleo deve ser mudada?

O objetivo do governo está correto: maximizar a receita para a sociedade. Mas a forma está errada. Não precisa criar empresa para isso. Pode apenas alterar o decreto que regulamenta a participação especial (taxa cobrada sobre campos de alta produtividade), que é hoje a maior fonte de arrecadação. Ela foi criada há 10 anos, com outras condições exploratórias e de mercado e precisa mesmo ser revista.

Mas o governo não deveria ter maior controle sobre a produção do pré-sal? A criação de uma nova empresa teria esse fim...

Ele já tem controle. A partir do momento em que promove licitações, define o ritmo das licitações, ele está manifestando seu controle sobre as reservas. Pode até mesmo estabelecer regras de exportação no contrato de concessão, sem necessidade de mudança da lei. Então, para aumentar a arrecadação, tem o mecanismo do decreto; para ter maior controle, pode usar o contrato de concessão.

O que o senhor acha que deve ser feito com as áreas situadas na região das descobertas do pré-sal que hoje não têm concessão?

Acho o seguinte: o ideal é mudar o decreto das participações especiais, jogar nas nuvens essa alíquota para aumentar a arrecadação do governo e licitar tudo. Somente com o bônus de assinatura do leilão o Brasil vai arrecadar boas dezenas de bilhões de reais. Depois o País terá uma tonelada de dinheiro entrando, rapidamente, pela participação especial. O decreto já foi instituído dessa forma, ele é dinâmico, leva em consideração essas mudanças. A formulação das participações especiais está associada às características ligadas à conjuntura. Foi pensado que isso poderia ser alterado em caso de redução de riscos (exploratórios) com a descoberta de novas fronteiras petrolíferas.

O presidente diz que quer usar o dinheiro do petróleo para a educação. Mas, para isso, precisaria mudar a lei...

O Lula entende assim, mas o que ocorre é que a União já recebe uma grande quantidade de recursos do petróleo, que são usados para outros fins ou acabam nem sendo usados. Boa parte da arrecadação vai para o governo federal, vai para os ministérios de Minas e Energia e do Meio Ambiente, vai para a Marinha.

Há críticas quanto à grande concentração de recursos em poucos municípios.

O conceito dos royalties para Estados e municípios onde estão as bacias produtoras é universal, é norma que sejam os maiores beneficiários, até porque se trata de uma forma de compensação pelos problemas causados pela indústria e permite que se preparem para depois que o petróleo acabar. Mexer na lei para alterar a distribuição dos royalties vai gerar grande disputa, todo mundo vai querer um pouco para si. Ninguém sabe quanto tempo pode durar e o que vai sair desse debate. Pode paralisar o setor por muito tempo.