Título: O novo imposto sindical
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/08/2008, Notas & Informações, p. A3

Sempre é bom lembrar que uma das principais bandeiras do moderno sindicalismo brasileiro, surgido no ABC paulista em inícios dos anos 1980, era a extinção de uma instituição típica do estadonovismo getulista, a saber, a contribuição sindical, que retira de todos os trabalhadores - sejam ou não sindicalizados - o valor de um dia de trabalho por ano. Só que esse discurso em prol da modernização do movimento sindical nunca se transformou em ação efetiva - antes pelo contrário. Mais recentemente, a partir de março deste ano, quando suas atividades foram regulamentadas, as centrais sindicais passaram a auferir metade do porcentual de contribuição que se destinava à Conta Especial Emprego e Salário do Ministério do Trabalho (MTb). Até então os recursos eram assim rateados: 60% para os sindicatos, 15% para as federações, 5% para as confederações e 20% para a mencionada conta a cargo do MTb - de onde se passou a carrear metade (10%) para as centrais.

Agora, depois que obtiveram o estatuto de entidades sindicais, as seis centrais sindicais do País assinaram documento comprometendo-se a enviar ao governo, até o próximo dia 21, um projeto para acabar, em definitivo, com a contribuição sindical compulsória. Por sua vez, o governo comprometeu-se a enviar o projeto ao Congresso imediatamente, assim como a ajudar a sua rápida tramitação. Em lugar da contribuição sindical as centrais pretendem instituir o que chamam de ¿contribuição negocial¿. Esta consiste em uma taxa aplicada sobre a remuneração anual dos trabalhadores de cada categoria, em porcentual a ser fixado em assembléia, toda vez que o sindicato concluir uma negociação salarial. A CUT propõe que essa taxa seja, no máximo, de 1%.

No momento em que decidir por esta ou aquela taxa, a assembléia estaria avaliando o desempenho do sindicato no processo de negociação. Assim, poderia ¿premiar¿ o sindicato, com uma taxa mais elevada, ou ¿puni-lo¿, com taxa menor. Mas esse ¿prêmio¿ - a nova forma de financiamento dos sindicatos - poderá significar castigo para a massa obreira.

Apesar de chamada de ¿negocial¿, a contribuição continuaria sendo compulsória, pois obrigaria a todos - sejam ou não sindicalizados, tenham ou não participado da assembléia que a estabeleceu.

Por outro lado, a faixa de porcentagens que as centrais estão querendo estabelecer deve acarretar a cobrança de valor maior do que a atual contribuição sindical. A troca do valor de um dia de trabalho pelo porcentual de remuneração pode levar a majorações como a ilustrada nesse exemplo: um trabalhador que ganha R$ 900,00 mensais e pagaria uma contribuição sindical de R$ 30,00, com uma taxa de 0,5% pagaria R$ 45,00 de ¿contribuição negocial¿. É de concluir, então, que as centrais sindicais estão acabando com a ¿contribuição sindical¿ para implantar um sistema mais rentável para sustentar sua máquina.

Pelo projeto das centrais desvincula-se do governo a distribuição de recursos, ao acabar com o porcentual a cargo do Ministério do Trabalho. A nova distribuição dos recursos será de 70% para os sindicatos, 15% para as federações, 5% para as confederações e 10% para as centrais sindicais. A indagação a fazer, então, é sobre a fiscalização desse processo. Hoje, tratando-se de dinheiro público, pois o imposto sindical é recolhido pelo governo e por ele repassado, o Tribunal de Contas fiscaliza. E quem fiscalizará essa massa de dinheiro quando o governo não tiver ingerência alguma sobre ela? Os recursos que sustentam a máquina sindical brasileira são vultosos. No ano passado, por exemplo, o imposto sindical rendeu R$ 1,2 bilhão. Há boas razões, com base nos usos e costumes do sindicalismo caboclo, para cobrar das entidades sindicais duas práticas essenciais às instituições das democracias: a do controle e a da transparência.

O fato, porém, é que uma troca da contribuição sindical pela contribuição negocial não ajudará na modernização do sistema sindical, que continuará sustentado por contribuição compulsória. O movimento sindical só se livrará de seus vícios quando for sustentado pela contribuição voluntária de seus membros.