Título: Aos 100 anos, GM luta contra o tempo
Autor: Silva, Cleide
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/08/2008, Negócios, p. B13

Com prejuízo equivalente a sete carros Celta por minuto, montadora toma medidas drásticas para evitar a concordata

Cleide Silva

Em setembro, a General Motors completará 100 anos de fundação, data que será marcada pela profunda crise da companhia. Só no último trimestre, a empresa registrou prejuízo global de US$ 15,5 bilhões. Significa que, a cada minuto, perdeu o equivalente a 7 modelos Celta.

O prejuízo equivale ao valor de mercado da Usiminas, maior fabricante de aços planos da América Latina. Com ele, daria para construir 17 fábricas como a de Gravataí (RS), uma das subsidiárias mais modernas do grupo. Inaugurada em 2000, a filial brasileira consumiu, até agora, US$ 900 milhões em investimentos.

A empresa, que no primeiro semestre perdeu para a Toyota o posto de maior fabricante de carros do mundo, corre contra o tempo para evitar uma concordata, conforme prevêem alguns analistas. Mesmo que escape da falência, a GM dificilmente voltará a ser a gigante do passado, pois terá de encolher para sobreviver.

Apesar da grave situação do grupo em seu principal mercado, os EUA, o vice-presidente de finanças global da GM, o chinês-canadense Ray Young, acredita em uma reviravolta similar à ocorrida no Brasil. A filial teve prejuízos durante oito anos e, em 2006, com Young à frente da operação, voltou ao azul, situação mantida até agora. No último trimestre, a região liderada pelo mercado brasileiro foi a que obteve o melhor resultado da companhia, com lucro de US$ 445 milhões.

Young comanda as finanças do grupo há 9 meses, depois de ter presidido a GM do Brasil entre 2004 e 2007. ¿Os quatro anos que estive no Brasil me treinaram bem para enfrentar os desafios à minha frente agora na matriz¿, disse ao Estado. Questionado se arrependeu-se da troca, desconversou: ¿Tenho saudades de morar e trabalhar no Brasil.¿

A empresa iniciou uma série de medidas para conter a sangria. Uma delas é a mudança do mix de produtos, com menos utilitários e picapes - que consomem muito combustível -, e aumento dos carros pequenos.

¿Não temos suficiente capacidade de produção nesses segmentos, por isso vamos adicionar um terceiro turno em duas fábricas em setembro e adequar uma fábrica para produzir um novo crossover (mistura de automóvel com utilitário).¿ De um total de 19 lançamentos de produtos nos EUA, 18 serão de passageiros e crossover.

Young disse que o Centro de Engenharia da GM do Brasil trabalha em projetos que poderão resultar em produtos para serem vendidos nos EUA. ¿Durante nossa reunião do Conselho neste mês tivemos oportunidade de revisar vários conceitos para produtos futuros, incluindo alguns desenvolvidos pelo design e engenharia da GM do Brasil.¿ Ele lembrou que a equipe brasileira já ajudou a GM a homologar o Saturn Astra, à venda nos EUA e Canadá.

Terceiro na hierarquia da GM, abaixo do presidente Rick Wagoner e do presidente global de finanças, Fritz Henderson - ambos com passagens pelo Brasil -, Young creditou parte do prejuízo no período abril-junho ao fraco mercado nos EUA.

No segundo trimestre as projeções apontavam para uma queda de 13% em relação ao mesmo período de 2007. ¿É uma grande queda num curto período. Além disso, com o aumento do preço da gasolina, o mix de produtos mudou rapidamente de picapes e utilitários para veículos de passageiros, onde temos menor lucratividade.¿

Segundo Young, a GM encerrou o segundo trimestre com caixa de US$ 21 bilhões e acesso a outros US$ 5 bilhões em linhas de crédito, o que garante fôlego ao negócio. Além disso, disse, ¿estamos muito focados na execução do plano recentemente divulgado para gerar US$ 15 bilhões adicionais de liquidez até o final de 2009.¿

O problema é que a empresa perde US$ 1 bilhão por mês. Segundo a revista The Economist, o banco Goldman Sachs estima que, até o fim de 2009, a GM terá US$ 8,7 bilhões em caixa, a menos que venda ativos. A pressão está aumentando. Sob a liderança de Wagoner, a GM perdeu US$ 70 bilhões em cinco anos. No início do mês, ele recebeu apoio dos acionistas mas, se os números não melhorarem, a situação pode mudar.