Título: Governança em rede
Autor: Ming, Celso
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/09/2009, Economia, p. B2

A reunião de cúpula dos chefes de Estado do Grupo dos 20 (G-20) quinta e sexta-feira da semana passada editou um extenso documento de 50 parágrafos mais os anexos, mas é provável que a principal consequência não esteja lá naquele papel com as 20 assinaturas.

A principal consequência pode ter sido menos tangível, mas nem por isso menos importante: a consolidação de um entendimento de que, numa economia globalizada, as decisões não podem ser tomadas independentemente, país por país, chefe de Estado por chefe de Estado.

Vai sendo entendido que é preciso coordenar globalmente as grandes políticas e isso tem agora de ser feito num âmbito mais amplo do que apenas o dos países ricos (G-8). Ou seja, é preciso incluir no círculo de tomada de decisões e de implantação de providências também as potências emergentes (G-20).

Isso vai limitar o exercício de soberania dos Estados nacionais. Mas, nesse ambiente tão interdependente, a governança tem de ser exercida em rede. O que acontece ou deixa de acontecer num país tem impacto nos outros e isso não vale apenas para as questões ambientais.

Na prática, significa que as políticas monetárias, políticas fiscais e todo o aparato de acompanhamento e supervisão das instituições financeiras têm de ser coordenados.

Uma importante consequência disso será o aumento da rigidez na condução de políticas econômicas. Ainda que os partidos políticos majoritários de um país concluam que "é preciso mudar tudo o que está aí", como pensava o PT no passado, não vai ser possível revirar drasticamente essas políticas. E, isso, não só porque contrariaria acordos, mas também porque é preciso levar em conta o impacto no resto do mundo e não só no próprio quintal.

A forma como os grandes bancos centrais manejam a política monetária (política de juros), por exemplo, tem enorme impacto sobre toda a economia global.

É fato sabido que uma das principais causas dessa última crise foi a decisão tomada pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano) de manter os juros muito baixos, ao redor de 1% ao ano, no período entre 2002 e 2004.

Os juros no nível do mar, por sua vez, aconteceram porque não havia inflação a combater, e entre as razões para isso estava aquela que tinha a ver com a política comercial entre Estados Unidos e China, que derrubou os preços dos produtos asiáticos.

Os grandes bancos centrais acreditavam até aqui que tinham total autonomia para injetar ou retirar o volume que bem entendessem de recursos do mercado e, no entanto, suas decisões têm forte impacto recíproco. O presidente do Banco da Inglaterra (banco central inglês), Mervyn King, queixa-se de que juros mais baixos nos Estados Unidos põem em movimento enormes operações de arbitragem (tomar emprestado a juros mais baixos para ganhar com a reaplicação a juros mais altos) que prejudicam sua própria política.

De mais importante entre as decisões tomadas está a de submeter os bancos aos padrões de segurança recomendados pelos acordos de Basileia. Mas, levando-se em conta que isso não é para já, foi dado o prazo até 2012 para completar o processo.

E, outra vez, faltou uma ação que apontasse para a superação da distorção maior, a mãe de todas as crises, que é o forte desequilíbrio no balanço de pagamentos entre as potências globais.

Confira

Sem revoada - A captação líquida da caderneta em setembro (até o dia 22) é quase 40% superior à do mesmo período de agosto. Mas não se viu a temida debandada de aplicações da renda fixa para as cadernetas em consequência da baixa dos juros. Nem é tão certo que haverá.