Título: Em falta, mestre de obras chega a ganhar R$ 10 mil em São Paulo
Autor: Rehder, Marcelo
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/09/2009, Economia, p. B10

Piso salarial de servente é hoje de R$ 767,8 por mês

Há pouco mais de dois meses, uma construtora pregou no muro de uma obra placas oferecendo diversas vagas para o início da construção de um condomínio com três prédios de 16 andares cada um na zona leste da capital paulista. Não apareceu nenhum candidato. A empresa precisou recrutar gente sem experiência para aprender com a prática dentro do próprio canteiro de obras.

Esse é lado mais visível da escassez de mão de obra especializada no mercado de trabalho brasileiro. Estratégico para o desenvolvimento do Brasil, o setor da construção civil passou praticamente ao largo da crise financeira mundial e acelerou o ritmo da demanda por trabalhadores nos últimos meses.

De acordo com levantamento feito pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), no primeiro semestre deste ano o nível de ocupação do setor nas seis principais regiões metropolitanas do País aumentou 2,1% em relação ao segundo semestre do ano passado.

A pesquisa indica que foram abertas 21 mil vagas na construção civil nesse período, o que inclui desde assalariados com e sem carteira de trabalho assinada a autônomos. Desse total, a região metropolitana de São Paulo respondeu por 14 mil novas vagas.

Na hora de preenchê-las, as construtoras deparam-se com a crescente escassez de mão de obra treinada. "Em quase 12 anos de trabalho em canteiro de obras, nunca foi tão difícil formar uma equipe", conta o mestre de obras José Ferreira da Silva, conhecido como Índio, de 38 anos.

Natural da tribo indígena Xucuru, com população atual de cerca de 3,5 mil índios, numa área de 26,9 mil hectares no município de Pesqueira, em Pernambuco, Silva deixou sua terra natal em 1997 para tentar a sorte na cidade grande.

Mestre de obras nos últimos quatro anos, Índio comanda atualmente uma equipe de cerca de 100 operários na construção de um condomínio na zona leste de São Paulo."Duas em cada cinco pessoas que trabalham hoje comigo não são especializados e estão aprendendo com os colegas experientes na obra."

Entre os 40 trabalhadores sem experiência que o mestre de obras teve que contratar está um primo seu, Gilberto Ferreira da Silva, de 34 anos, um ex-motoboy que resolveu largar a vida agitada e perigosa que levou nos últimos sete anos.

"Comecei há pouco mais de um mês como servente de carpinteiro e já aprendi muita coisa da nova profissão", conta. "No primeiro dia, achei cansativo, mas depois de três dias vi que não é tão difícil e comecei a gostar."

O piso salarial de servente é hoje de R$ 767,8 por mês, o equivalente a R$ 3,49 por hora. Com as horas extras, pode-se ganhar entre R$ 850 a R$ 1 mil. Mesmo assim, é menos do que Silva ganhava como motoboy. Mas ele encara a situação atual como um investimento. Em menos de oito meses, ele pode se tornar oficial qualificado, cujo piso é de R$ 917,40 por mês, ou R$ 4,17 por hora. Na prática, ganha-se de R$ 2,5 mil a R$ 2,8 mil mensais.

Silva quer ser mestre de obras, como o tio. "Um mestre de obras ganha de R$ 6 mil a R$ 10 mil por mês", diz Índio, sem dar mais detalhes sobre o seu salário. "Recentemente, fui convidado para trabalhar numa grande empresa, fora de São Paulo, para ganhar R$ 2 mil a mais. Resolvi ficar porque gosto do ambiente daqui."

Para atravessar a crise sem grandes sobressaltos, a construção civil contou com a ajuda de uma série de medidas tomadas pelo governo federal. Entre elas, destacam-se a manutenção dos investimentos no âmbito do Programa de Aceleração Econômica (PAC) e as políticas de desoneração seletiva de impostos dos materiais de construção, além do lançamento do programa de habitação popular Minha Casa, Minha Vida.