Título: Relatório a pedido de Sarney isenta Mesa por atos secretos
Autor: Colon, Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/10/2009, Nacinal, p. A8

Segundo parecer, conteúdo desses documentos é "corriqueiro" e não há dúvida quanto à sua legalidade

Quase quatro meses depois da revelação da existência de atos secretos no Senado, um relatório feito por dois funcionários, a pedido do presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), isenta os parlamentares de qualquer responsabilidade pela prática ilegal de esconder medidas administrativas. A conclusão afirma ainda que o conteúdo desses boletins sigilosos - usados para nomear parentes, amigos e criar privilégios aos próprios senadores e funcionários - é "corriqueiro". "Não continha sequer dúvida quanto à legalidade", registra o texto.

O documento é assinado pelo diretor-geral, Haroldo Tajra, e pelo advogado Luiz Augusto Geaquino dos Santos. Tajra foi designado em julho por Sarney para analisar a validade dos atos secretos.

No dia 10 de junho, o Estado revelou a existência de centenas de boletins sigilosos e o conteúdo desses documentos, abrindo uma crise no Senado que levou colegas a pedirem a renúncia de Sarney após a descoberta de que seus parentes e afilhados, além de aliados políticos, haviam sido beneficiados pela prática. Depois de um acordo com a oposição e governistas, ele ficou livre de processo de cassação no Conselho de Ética do Senado.

Partiu do diretor Haroldo Tarja, ex-assessor de Efraim Morais (DEM-PB), a determinação para a validação, nos últimos dois meses, de cerca de 190 atos secretos, entre 511 descobertos, incluindo as medidas que beneficiaram familiares e amigos do presidente da Casa e as 36 assinadas pela Mesa Diretora para a criação de cargos de confiança.

Não entraram nesse lote os outros 467 boletins identificados em agosto, editados entre 1998 e 2000, ainda em fase de investigação.

Na quarta-feira à noite, Tajra entregou a sua conclusão ao presidente do Senado. Para livrar os integrantes das Mesas Diretoras que administraram a Casa entre 1995 e 2009 - período de edição dos atos secretos -, entre eles o próprio Sarney, Tajra e Geaquino encontraram o seguinte argumento: assinar um ato secreto não é irregular.

NENHUM ARRANHÃO

Assinada, a medida teoricamente "existe", explicam. "A legalidade de seu conteúdo no momento da assinatura não sofre sequer um arranhão pela falta de publicação posterior. Uma vez assinado, este passou a existir", diz o texto.

O erro, segundo Tajra e Geaquino, é não publicar as medidas administrativas. O relatório lembra então que o diretor-geral e o diretor de Recursos Humanos, subordinados à Mesa Diretora, são os responsáveis pela publicação dos atos.

Esse documento deve pôr um fim na investigação administrativa sobre o conteúdo dos atos secretos. Restam agora dois processos disciplinares, um contra o ex-diretor-geral Agaciel Maia - considerado o "todo poderoso" da Casa durante 14 anos até cair em março por ter ocultado a posse de uma mansão, de R$ 5 milhões, em Brasília - e o outro que apura a responsabilidade de João Carlos Zoghbi, ex-diretor de Recursos Humanos.

Ambos foram acusados por servidores de determinarem a não publicação desses atos. O Ministério Público e a Polícia Federal conduzem, desde junho, inquérito sobre o caso.

O relatório da Diretoria-Geral contradiz posição adotada pelo Ministério Público em recomendação enviada pelos procuradores em junho ao Senado. Segundo a conclusão dos servidores da Casa, "a publicação é uma formalidade posterior à prática do ato e não lhe fundamenta a validade material".

Os procuradores discordam: "Quando determinado ato que exige ampla publicidade não é publicado ou não observa o instrumento adequado de divulgação, diz-se que o ato é nulo."