Título: Deputados do País ouvem críticas e defendem Lula
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/10/2009, Internacional, p. A12

Missão brasileira garante a juízes e congressistas que volta de Zelaya não teve participação do governo

Seis deputados brasileiros tomaram ontem, no Congresso Nacional hondurenho, uma aula sobre como preparar um golpe de Estado supostamente legal. Ouviram ainda da comunidade brasileira residente no país um explícito apoio ao governo de facto de Honduras e à edição do decreto que instaurou o estado de sítio no último final de semana. A missão da Câmara de Deputados recebeu ainda uma dura crítica da Corte Suprema de Justiça à interferência do governo brasileiro na crise hondurenha, ao permitir o abrigo do presidente deposto Manuel Zelaya em sua embaixada e ao esquivar-se de definir o status do seu hóspede.

Liderada pelo deputado Raul Jungmann (PSB-PE), a missão enfrentou dificuldades para ultrapassar as barreiras do Exército e da Polícia Nacional, para ingressar na embaixada brasileira. Só teve sucesso porque o Congresso e a Corte Suprema deram expressa autorização. Pouco antes, os deputados haviam visitado as duas instituições cientes de que seus interlocutores eram articuladores do golpe de Estado de 28 de junho, que derrubou Zelaya, e hoje são pilares de sustentação do presidente de facto, Roberto Micheletti - que não foi visitado pela missão.

"Já sabemos disso", respondeu a deputada Janete Rocha Pietá (PT-SP), ao ser alertada sobre esse fato.

Em ambos os encontros, Jungmann insistiu que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o chanceler Celso Amorim desconheciam a "articulação para que Zelaya se materializasse na embaixada brasileira". Jungmann tentou explicar que, de acordo com a tradição da diplomacia brasileira, não havia como recusar o pedido de abrigo. Mas, completou ele, o governo Lula se sente desconfortável com a interferência de Zelaya, de dentro da embaixada, na vida política do país. "Mesmo sendo críticos à atuação do Brasil, estamos convencidos de que não houve participação do presidente Lula nem do chanceler Amorim", afirmou Jungmann.

Os deputados ingressaram ao Parlamento hondurenho pela garagem, onde soldados do Exército que se revezam no cerco ao prédio lanchavam ao lado das pilhas de colchões. Na sala nobre, foram recebidos pelo presidente do Congresso, deputado José Saavedra, do Partido Liberal - o mesmo que se beneficiaria com a proposta do governo de facto de renúncia de Micheletti e de Zelaya. Feitas as apresentações, os deputados brasileiros tiveram de assistir a um vídeo que mostrou a cronologia de fatos que, do ponto de vista do governo de facto, conferiu legitimidade ao golpe de 28 de junho.

"Os senhores sabem que movemos um processo de impeachment em 1992, que levou à renúncia do presidente Fernando Collor de Mello. A nossa perplexidade é: por que Zelaya não teve direito à defesa?", questionou Jungmann. A resposta deveria vir durante o almoço oferecido por Saavedra. "Ele ficou mudo", relatou Ivan Valente.

MARCHA DA FAMÍLIA.

No encontro com a Comunidade Brasileira de Residentes em Honduras, os deputados foram surpreendidos pela total condenação das "ações do Itamaraty, que marcaram um retrocesso nas relações diplomáticas" bilaterais, e do "fato de que o nosso governo não levou em consideração o nosso bem-estar". A insatisfação foi transcrita em um manifesto, entregue aos parlamentares e publicado no jornal El Heraldo, porta-voz do governo de facto. O que mais impressionou os deputados, entretanto, foi a defesa dos brasileiros ao estado de sítio. Em especial, à presença ostensiva de tropas do Exército pelas ruas de Tegucigalpa. "Pareciam os membros da Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade falando", arrematou Ivan Valente.