Título: Leis rígidas, fiscalização falha
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/10/2009, Notas e informações, p. A3

Há pelo menos 180 lojas e depósitos clandestinos de fogos de artifício instalados na cidade de São Paulo, segundo estimativa da Associação Brasileira de Pirotecnia (Assobrapi). Boa parte deles está em área residencial, para driblar uma fiscalização que já é precária. A própria Divisão de Produtos Controlados da Polícia Civil, responsável pela vistoria desses estabelecimentos, confirma que existem apenas 80 lojas autorizadas a vender e armazenar fogos na capital e, em todo o Estado, há apenas três fábricas autorizadas pelo Exército a produzir fogos de artifício - todas em zona rural.

Dados da Assobrapi mostram a existência de aproximadamente mil lojas legalizadas na capital em 1970. Segundo o vice-presidente da entidade, Eduardo Tsugiyama, o endurecimento das leis e o aumento da demanda provocaram a multiplicação dos estabelecimentos clandestinos. A associação credenciou apenas 60 na capital. Para funcionar, o proprietário de um estabelecimento desse tipo precisa cumprir as normas municipais de uso e ocupação de imóveis, além de ter autorização dos Bombeiros e da Polícia Civil.

As leis que regulamentam o comércio, a estocagem e a fabricação de fogos de artifício são avançadas e se tornam mais rígidas depois de cada explosão que devasta quarteirões e vidas. A elaboração de novas normas é sempre a resposta das autoridades à indignação da opinião pública diante das tragédias e do jogo de empurra entre os vários órgãos que deveriam responder pelo alvará de funcionamento dos estabelecimentos, pela fiscalização do uso dos imóveis, da documentação e das questões de segurança.

Os serviços de fiscalização não acompanham a evolução das leis. É tradicional a falta de recursos humanos, o despreparo dos agentes e a corrupção no setor. Quanto mais rígidas as leis e mais falha a fiscalização, mais lojas clandestinas se estabelecem, ameaçando a população.

No início da tarde do último dia 24, a loja de fogos de artifício Pipas & Cia., localizada em Santo André, foi para os ares destruindo 4 imóveis vizinhos, desalojando 100 pessoas, matando 2 e ferindo 12. Horas depois do acidente, autoridades municipais de Santo André afirmaram que não há nenhum estabelecimento em todo o município autorizado a vender fogos de artifício.

A tolerância zero deveria facilitar, assim, a fiscalização. Afinal, nem trabalho de conferência de documentação seria necessário, uma vez que a atividade é proibida. O secretário de Comunicação da cidade, Alexssander Soares, declarou que a prefeitura desconhecia a existência da loja Pipas & Cia. "A fiscalização só pode agir se for provocada", afirmou - o que é um absurdo. Mas a fiscalização havia sido provocada em 16 de abril, por meio de um e-mail enviado à Ouvidoria municipal e, se nenhuma loja está autorizada a funcionar, essa deveria ter sido fechada há cinco meses, pelo menos. Mas o que parece é que a "provocação" que faz as autoridades darem atenção ao problema só ocorre quando há explosões.

No dia seguinte ao acidente de Santo André, tanto a prefeitura daquele município quanto a da capital decidiram intensificar a fiscalização desse tipo de estabelecimento. No sábado passado, o prefeito Gilberto Kassab baixou portaria que determina a todas as 31 subprefeituras a elaboração, no prazo de quatro dias, de um levantamento das lojas que vendem fogos de artifício na cidade. O prefeito exige também que a fiscalização feche os estabelecimentos irregulares e apreenda os produtos.

A lei municipal de São Paulo estabelece que fogos de artifício não podem ser comercializados em áreas residenciais e a menos de 100 metros de postos de gasolina, depósitos de produtos inflamáveis ou explosivos, escolas, hospitais, cinemas, teatros, casas de espetáculos e repartições públicas. Para o secretário municipal de Controle Urbano, Orlando Almeida, as regras garantem a segurança da população, mas, em entrevista ao Estado, considerou: "Por mim, deveriam até ser mais duras. O certo seria não comercializar no Município." Melhor seria se assim fosse, consideradas as dificuldades para se estabelecer controle eficiente.