Título: Retorno de subsídios ajuda a engordar caixa
Autor: Otta, Lu Aiko
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/10/2009, Economia, p. B4

Depósitos judiciais e dividendos também são usados O governo vem fazendo um remendo atrás do outro na meta de superávit primário do setor público e arrebanhando dinheiro numa prática típica da expressão "tirar coelhos da cartola". Além de engordar o caixa com depósitos judiciais e exigir das empresas estatais maior pagamento de dividendos, como foi divulgado nesta semana, o governo ampliou suas receitas em R$ 4,2 bilhões com o retorno de subsídios pagos pelo Tesouro Nacional nos empréstimos concedidos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND).

O dinheiro do FND foi repassado entre janeiro e agosto pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES). O valor foi tão elevado que fez a conta de despesas com subsídios sair do vermelho, o que normalmente não ocorre. Assim, em vez de gastar com subsídios concedidos pela União, o Tesouro recebeu. O FND foi criado em 1986 para apoiar a modernização do setor produtivo.

O superávit de R$ 26,5 bilhões nas contas do Governo Central (INSS, Tesouro e Banco Central) de janeiro a agosto se deve a manobras fiscais para evitar déficit. A estratégia ainda contemplou um aumento de R$ 8,4 bilhões das receitas com dividendos, em relação ao ano passado, e mais R$ 7,9 bilhões com depósitos judiciais. Os dividendos pagos já somam no ano R$ 18,2 bilhões, a maior parte pelo BNDES. O Tesouro também adiou pagamentos de despesas do Programa de Aceleração Econômico (PAC) e outros investimentos.

Não fosse isso, em vez de superávit de R$ 3,7 bilhões, o governo teria amargado mais um déficit, já que a a arrecadação não tem reagido. E teria descumprido a meta de superávit de R$ 25 bilhões no segundo quadrimestre, prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

Boa parte das incertezas sobre a política fiscal vem dessas manobras. A percepção é que o superávit tem se transformado num dado cada vez menos informativo sobre a verdadeira situação das contas públicas. Como a meta é cada vez menos relevante para prever o que ocorrerá, surgem dúvidas sobre a eficiência da política fiscal.

Os problemas aumentaram depois que o governo reduziu mais uma vez a meta de superávit deste ano, ampliando em R$ 12,9 bilhões o volume de despesas com investimentos que pode ser abatido. O governo também pode lançar mão dos recursos do Fundo Soberano do Brasil para fazer o superávit.

"A cada dia é uma surpresa. Que superávit é esse? Após excluir cada vez mais despesas do cálculo de primário, nada melhor que incluir receitas que não o são", critica o economista-chefe da Convenção Corretora, Fernando Montero. Ele se refere aos depósitos judiciais, que não são receitas líquidas e certas. Se perder na Justiça, o governo terá de devolver o dinheiro ao contribuinte em 24 horas. "O Paulo Bernardo (ministro do Planejamento) diz que nenhum governo fez tanto superávit, mas nenhum desfez tanto superávit tão rapidamente."