Título: Assembleia muda licença-prêmio e paga até 2 salários a mais a servidor
Autor: Brandt, Ricardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/10/2009, Nacional, p. A4

Os 2.853 funcionários poderão vender 60 dos 90 dias do benefício, pressionando folha do Legislativo paulista

Os 2.853 servidores da Assembleia Legislativa de São Paulo tiveram ampliado um benefício já extinto no funcionalismo público federal e em alguns municípios, a licença-prêmio - uma regalia concedida aos servidores como recompensa por assiduidade ao serviço. Em um ato interno, a Mesa Diretora aprovou no último dia 10 resolução que autoriza no Legislativo a venda de até 60 dias, dos 90 previstos de descanso por conta da gratificação.

A medida incha ainda mais a folha de pagamentos do Legislativo, que este ano consumirá R$ 485 milhões, o equivalente a 82,8% de seu Orçamento.

Criada em São Paulo dentro do estatuto do funcionalismo público em 1968, auge da ditadura militar, a licença-prêmio é um benefício que dá ao servidor 90 dias de folga remunerada a cada cinco anos de serviços prestados sem faltas injustificadas ou com até no máximo 30 ausências amparadas por atestados. Penas administrativas também cassam a bonificação.

Como ocorre no Executivo e no Judiciário, a possibilidade de converter os dias de folga em dinheiro existia para os funcionários do Legislativo, mas era uma exceção reservada apenas para casos em que a presença do servidor era essencial e os recursos para os pagamentos estivessem disponíveis no Orçamento - abrindo precedentes para excessos.

A partir da resolução aprovada pela Mesa, todo servidor da Assembleia com direito a licença-prêmio pode requerer a venda de dois terços dos dias de folga, sem justificativa. Além disso, sob o valor pago pelos dias parados não incidem tributos (nem Imposto de Renda, nem contribuições previdenciárias), nem o teto salarial (que é de R$ 16 mil/mês).

Atualmente, 1.070 dos 2.853 servidores da Casa estão aptos a requerer a licença-prêmio e se beneficiam imediatamente com a decisão. A presidência da Assembleia, por meio de sua assessoria de imprensa, informou não poder calcular o impacto financeiro que a ampliação do benefício trará.

O gasto dos últimos dois anos, no entanto, mostra o que acontecerá. Em 2007, quando a conversão das folgas não tiradas da licença-prêmio em pecúnia era uma exceção, foram gastos R$ 3 milhões com esse tipo de despesa - 0,8% da folha.

Em 2008, a Mesa Diretora baixou um ato (23/2008) no fim do ano permitindo que os servidores com direito ao benefício até aquela data poderiam receber em dinheiro até 30 dias dos 90 de descanso, sem necessidade de argumentação de "absoluta necessidade de serviço". O dispêndio com os pagamentos triplicou, chegando a R$ 10,7 milhões - 2,3% da folha.

Entre os beneficiados estão servidores que poderão receber cifras acima de R$ 50 mil pela venda das folgas. É que, dentro do quadro de 908 funcionários concursados da Assembleia, alguns adquiriram direitos ao longo dos anos que fazem seus salários chegarem a R$ 25 mil, mas na prática podem receber apenas o teto imposto por lei, R$ 16 mil mensais. Como a licença-prêmio é considerada indenização, não vencimento, o entendimento jurídico é que sobre ela não devem incidir nem impostos nem o teto, o que torna a venda dos dias de descanso um negócio lucrativo para os funcionários e caro para os cofres públicos.

Considerada uma regalia já ultrapassada do funcionalismo brasileiro, no serviço público federal a licença-prêmio foi substituída, em 1997, pela licença para capacitação, que em vez de folga prevê um prazo, a cada período trabalhado, para reciclagem profissional.

No Estado de São Paulo, o benefício é mantido até hoje, mas desde sua criação passou por restrições como a de 1999, quando o então governador Mário Covas (PSDB) estipulou um prazo mínimo para que as folgas fossem tiradas (4 anos e 9 meses, caso contrário, o benefício caducava).

No ano passado, o governador José Serra (PSDB) editou uma lei complementar (1.048/2008) que acabou com esse prazo, mas estipulou que cada Poder (Executivo, Legislativo e Judiciário) regulamentasse o assunto à sua maneira.

Com exceção do Legislativo, a possibilidade de converter as folgas em dinheiro continuou proibida, salvo os casos especiais. No Executivo, por exemplo, a possibilidade é dada a policiais e professores, casos em que as ausências e suas substituições são mais complexas.

CONQUISTA

"Essa foi uma conquista do funcionalismo, que não tem direito a fundo de garantia", defende a presidente do Sindicato dos Servidores da Assembleia Legislativa, Rosely Assis.

O argumento é que, como o funcionalismo não tem Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), a possibilidade de conversão da licença-prêmio em dinheiro acaba servindo como "compensação". Pela lei, porém, o direito às folgas pressupõe o descanso para quem durante os anos de serviço não se ausentou sem justificativa.

O presidente da Assembleia, Barros Munhoz (PSDB), defendeu, por meio de sua assessoria, a legalidade do ato.