Título: Temer manobra para esvaziar cobranças
Autor: Madueño, Denise
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/10/2009, Nacional, p. A10

Presidente da Câmara mantém sem resposta ofício da Justiça que pede informações sobre deputados beneficiados com verba indenizatória

Há um mês o presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), mantém guardado na gaveta, sem resposta, ofício da Justiça Federal em Brasília pedindo informações dos deputados beneficiados com a verba indenizatória, o recurso criado em 2001 para pagar despesas dos parlamentares em seus Estados com o exercício do mandato. A juíza Mônica Sifuentes, da 3ª Vara Federal, precisa do número de CPF dos políticos que receberam o recurso para instruir ação popular que busca suspender o ato da Mesa da Câmara que instituiu o benefício.

Apesar da simplicidade do pedido, apenas o nome e o número do CPF, informação constante nos arquivos da Casa e facilmente identificada, os procedimentos necessários para a resposta não foram sequer iniciados. O fato é significativo na conduta que Temer vem mantendo quando o assunto envolve a Justiça, os parlamentares e a própria Câmara. Temer conseguiu ficar por 42 dias cumprindo uma liminar do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), sem resultar em efeito prático.

O ministro determinou que a Câmara entregasse ao jornal Folha de S. Paulo cópia das notas fiscais apresentadas pelos deputados para justificar os gastos com a verba indenizatória. Enquanto argumentava com a dificuldade de tirar cópias de cerca de 70 mil notas fiscais, entrou com recurso no Supremo e, na semana passada, a decisão de Mello foi cassada pelo plenário do tribunal.

A assessoria de Temer nega de forma veemente que tenha havido demora no cumprimento da liminar. Alega que a decisão começou a ser cumprida imediatamente, mas, por causa do grande volume de cópias, não foi possível concluir o procedimento no período em que vigorou a liminar. E ressalta que há grande disposição do presidente em relação ao Judiciário.

O recurso foi também o instrumento usado pela Câmara para evitar o cumprimento de decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que determinou que o teto salarial fosse obedecido. Em 24 de junho, o tribunal comunicou à Câmara a necessidade de cortar os salários dos deputados - daqueles que recebem por mais de uma fonte - acima do valor de R$ 24.500. Temer não cortou e recorreu da decisão por meio de um embargo de declaração. O argumento foi a falta de meios para identificar o parlamentar que recebia por mais de uma fonte, além de questionar em que folha de pagamento haveria o corte salarial, na Câmara ou no local responsável pela outra remuneração. A Casa conseguiu manter o pagamento integral.

DONO DO CASTELO

No caso do deputado Edmar Moreira (PR-MG), que ficou conhecido por ser dono de um castelo, repassado aos filhos, a demora de Temer em responder às solicitações quase resultou em ação de responsabilidade do Ministério Público Federal contra ele. Por vários meses, a Casa segurou as notas fiscais apresentadas à Câmara pelo deputado para comprovar gastos com a verba indenizatória. O procurador no TCU Marinus Marsico precisou fazer diversos contatos com a Câmara e pedir envio de ofício avisando que abriria processo contra Temer.

Dois meses depois de Moreira ter sido absolvido no processo de cassação no Conselho de Ética, os documentos chegaram às mãos do procurador. "Chegou a um ponto em que não havia resposta e poderia acarretar na responsabilização", lembrou Marsico.

No dia 23 de setembro, Temer e o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, assinaram procedimento de aproximação dos dois lados. Pelo acordo, antes de abrir processo contra a Casa, o Ministério Público comunicará o fato ao grupo que será formado por representantes da Câmara e da Procuradoria. "Se houver problema de má administração na Câmara, no lugar de propor a ação, o grupo fará um ajustamento", disse Temer.

Para evitar surpresas com liminares, a Câmara tem projeto pronto, que prevê que nos mandados de segurança contra ato do STF, do presidente da República e das Mesas da Câmara e do Senado a medida para suspender esses atos só poderá ser concedida por decisão da maioria do tribunal. A proposta, aprovada pelo Senado, tem parecer favorável do relator, Sérgio Carneiro (PT-BA), e conclusão na Comissão de Constituição e Justiça, ou seja, não precisa ser votado no plenário.