Título: Preocupadas com ranking, escolas pressionam alunos a fazer o Enem
Autor: Mazzitelli, Fábio
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/10/2009, Vida&, p. A18

Desde 2006, prova é usada para listar os melhores colégios; depois dos problemas, estudantes estão desmotivados

O descarte do uso do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) nos vestibulares da Fuvest, Unicamp e PUC-SP, depois do adiamento da prova, levou escolas particulares de São Paulo a adotar estratégias para convencer os alunos a participar. As instituições reconhecem que parte dos alunos está desmotivada e desistiu de fazer a prova, o que pode ter efeito negativo na nota geral dos colégios. Desde 2006, o Ministério da Educação passou a divulgar uma nota consolidada das escolas no Enem - antes disso, havia apenas o desempenho do aluno. A nota se tornou o único critério objetivo para avaliar escolas particulares e passou a ser referencial de qualidade para pais de alunos, norteando as escolhas das famílias para matricular seus filhos. O ranking também aumentou a cobrança interna por melhor desempenho no exame e acirrou a competição entre as instituições privadas.

A Fuvest, que seleciona para a Universidade de São Paulo (USP), além da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e a Pontifícia Universidade Católica (PUC), que reúnem quase 200 mil candidatos, utilizavam há anos o Enem para compor a nota de seus vestibulares. O uso foi descartado após o exame ser remarcado para 5 e 6 de dezembro. O adiamento ocorreu depois que o vazamento do Enem foi revelado ao Ministério da Educação pelo Estado na semana passada.

"Há um nítido desânimo em prestar o Enem e, se poucos alunos prestarem, isso nos preocupa. A representatividade do Bandeirantes e das principais escolas será mais atingida", diz Mauro de Salles Aguiar, diretor-presidente do Colégio Bandeirantes, que ficou na terceira colocação no Estado de São Paulo no último ranking do Enem.

Aguiar conta que pediu a todos os professores que passem a estimular seus alunos a fazer o exame. "Toda escola boa quer estar adequadamente representada. Daqui a um ano, quando soltarem o ranking, todos vão esquecer dos problemas que houve no Enem."

Segundo colocado no Estado, o Colégio Vértice orienta os alunos a participar do exame, mas faz uma ressalva: "Se for desmotivado, melhor não ir. Se vai, nada de fazer corpo mole. É a nossa colocação para eles", diz Adílson Garcia, diretor da escola.

Há todo tipo de estratégia para convencer os alunos. "Falamos para o professor alimentar o assunto pausadamente, com intervalos. Uma hora é um professor que fala (que é importante fazer o Enem) e, depois, é outro", diz Silvio Barini, diretor do Colégio São Domingos. Ele conta que a escola fez um trabalho neste ano para tentar melhorar o desempenho no exame e agora lamenta que os estudantes não participem. "Há um desencanto que vamos tentar tratar. Isso preocupa pela imagem do colégio e pelo descrédito com relação ao exame."

"Alguns professores disseram que é bom que a gente faça o Enem porque isso pode ajudar no currículo mais tarde", afirma Mário Hatorri, aluno do colégio Etapa, que vai tentar Medicina e não desistiu do Enem.

"O exame ficou sem propósito para mim que vou tentar Fuvest, PUC e FGV. Só vou fazer porque é uma forma de avaliar o ensino médio do Brasil", diz Jean Michel Ceguin, de 17 anos, que quer prestar Direito. Ele é aluno do Vera Cruz e está preocupado com a posição da escola no ranking, apesar de não ter percebido nenhuma pressão dos professores.

O diretor pedagógico do Colégio Móbile, quinto lugar no ranking do Estado, Blaidi Sant"Anna, também confirma que os alunos da escola estão desistindo de participar. "Isso prejudica sim o resultado do colégio."

Para o presidente do Conselho Estadual de Educação (CEE), Artur Fonseca Filho, esse problema está centrado em São Paulo porque os principais vestibulares desistiram de usar a nota do Enem. Entre as públicas, só a Universidade Estadual Paulista (Unesp) ainda não decidiu se usará ou não o exame. No restante do País, onde as instituições mais procuradas são federais, alunos devem continuar participando porque elas mantiveram a adesão ao Enem e até mudaram datas de vestibulares coincidentes.

COLABOROU MARTA VALIM