Título: HIV é resistente a medicação em 7% dos pacientes com aids
Autor: Cimieri, Fabiana
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/10/2009, Vida&, p. A19

Índice do Brasil é considerado alto pela OMS; entidade pede ao governo mudança na política

Um estudo feito com 400 pessoas de 13 cidades brasileiras mostrou que a resistência ao vírus da aids em pacientes que ainda não receberam tratamento com antirretrovirais (resistência primária) é de 7%. A Organização Mundial da Saúde (OMS) pedeque o governo ofereça o exame de genotipagem caso esse porcentual fique acima de 5%. O Ministério da Saúde admite que poderá rever seus critérios no futuro se os resultados do estudo forem confirmados por pesquisas clínicas.

A genotipagem é um teste que faz o sequenciamento genético do vírus e permite saber de antemão a quais drogas o paciente é resistente.

Atualmente, o Ministério da Saúde só oferece o exame quando o coquetel com antirretrovirais não está fazendo o efeito desejado ou em crianças que foram infectadas pelas mães ainda na gravidez, por meio da transmissão vertical.

Para um dos coordenadores do estudo, Marcelo Soares, do Departamento de Genética da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o estudo mostra que há necessidade de o Ministério da Saúde repensar sua política. Segundo a coordenação do Programa Nacional DST/Aids, no entanto, é preciso que sejam feitos novos estudos para determinar se há realmente uma melhora no tratamento dos pacientes que souberem antes que possuem o vírus resistente.

Os dois principais obstáculos para a implementação do exame em larga escala é que não há fabricantes nacionais e o custo teria um alto impacto na saúde pública. O Ministério da Saúde paga US$ 122,89 por teste e ainda não existem grupos de pesquisa trabalhando no desenvolvimento de um exame nacional.

Ao mesmo tempo, diz ele, "o resultado mostra que a orientação de só iniciar o tratamento aos primeiros sintomas de imunodeficiência é acertada". No Brasil, o paciente com HIV recebe o coquetel quando começa a desenvolver infecções oportunistas e exames laboratoriais confirmam a diminuição de defesa imunológica.

Nos EUA e na maioria dos pacientes da Europa, a medicação começa a ser tomada assim que a infecção pelo HIV é confirmada. Nesses países, o porcentual de resistência do vírus ao ser diagnosticado varia entre 9% e 16%, muito maior, portanto, que no Brasil.

CASOS

São Paulo tem 60% dos casos de HIV resistente. Os pesquisadores estão surpresos com o fato de a cidade concentrar dois terços dos casos desse tipo de resistência. A explicação mais provável é a de que São Paulo concentra o maior número de pacientes diagnosticados e foi a primeira cidade a oferecer tratamento gratuito, no fim dos anos 80.

"A exposição ao antirretrovirais cria um vírus que, ao ser transmitido, é mais resistente", explicou Soares.

Um estudo anterior, nos mesmos moldes do atual, foi realizado com um número menor de pacientes diagnosticados em 2001 e 2002.

"Os resultados são similares, o que mostra que não houve um aumento significativo da resistência", diz o pesquisador. Uma outra constatação é a de que, entre as drogas utilizadas no coquetel com antirretroviral, as que possuem maiores porcentuais de resistência foram a nevirapina e o efavirenz. "São as mais usadas e por isso, intuitivamente, esperávamos esse resultado", disse Soares.

Em relação aos subtipos da doença, o estudo mostrou que o HIV-B, o mais prevalente no País, aparece mais frequentemente como resistente entre os pacientes que ainda não começaram tratamento contra a doença.

O subtipo C, que prevalece no Sul do Brasil e na África, não oferece tanta resistência nessas mesmas condições, apesar de outras pesquisas indicarem que ele pode ser mais agressivo.

A pesquisa, que foi realizada por 20 centros de pesquisa em HIV/aids, foi delineada pelo professor Eduardo Sprinz, do Hospital das Clínicas de Porto Alegre, e publicada na edição de setembro da revista Aids Research & Human Retroviruses.