Título: Mantega admite reter restituição do IR
Autor: Andrade, Renato
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/10/2009, Economia, p. B6

Para ministro, adiar as devoluções do imposto é procedimento ""normal"", provocado pela queda da arrecadação

O governo admitiu ontem que está adiando o pagamento das restituições do Imposto de Renda das pessoas físicas por causa da forte queda da arrecadação de impostos e contribuições. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, tentou atenuar a decisão, argumentando que o procedimento é "normal", dada a situação do caixa federal, e afirmou que os contribuintes não serão prejudicados.

A decisão de retardar o repasse das restituições teria sido tomada em maio, segundo informou ontem a Folha de S.Paulo. Mantega, por sua vez, afirmou que a avaliação sobre o volume de pagamento das restituições é feita mensalmente e segue o fluxo de caixa do governo. "Não há nenhum artificialismo, estamos agindo de forma normal."

Para preservar o caixa do Tesouro, o governo tem privilegiado as restituições de valor mais baixo, deixando as quantias maiores para depois. Com isso, o valor dos lotes de restituição têm sido menores. Essa estratégia já rendeu este ano uma economia de R$ 1,5 bilhão ao governo em comparação com os pagamentos feitos no ano passado no mesmo período.

Os pagamentos de restituições do Imposto de Renda este ano somaram até agora R$ 4,381 bilhões, e a Receita promete liberar mais R$ 1,12 bilhão no dia 15, valor referente ao quinto lote de restituição. Em 2008, os quatro primeiros lotes de devolução do imposto pago a mais pelos contribuintes totalizaram R$ 5,6 bilhões. Até outubro do ano passado, já haviam sido devolvidos R$ 7 bilhões.

Para Mantega, os contribuintes que têm imposto a ser restituído não precisam temer nenhum prejuízo, uma vez que o pagamento, quando for efetuado, terá seu valor corrigido pela variação da taxa básica de juro, a Selic, referente ao período.

O processo de recuperação da atividade econômica ainda não se materializou em termos de aumento do fluxo de dinheiro para os cofres da Receita Federal do Brasil este ano. De janeiro a agosto, a arrecadação federal ficou R$ 34,9 bilhões abaixo do volume no mesmo período do ano passado, de acordo com os dados mais recentes divulgados pelo Fisco.

A decisão da Fazenda é mais uma das medidas que têm sido tomadas para tentar manter um certo nível de recursos no caixa federal. Para engordar os cofres, o governo já decidiu este ano exigir um pagamento maior de dividendos das estatais, transferiu para o Tesouro depósitos judiciais que estavam em outros bancos, além de ter determinado o retorno de R$ 4,2 bilhões em subsídios pagos nos empréstimos concedidos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND).

Atrasar as restituições do IR, no entanto, não é uma medida inédita. Em 2003, o então secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, solicitou à Receita que reduzisse o ritmo de pagamento das restituições por causa da difícil situação do caixa do governo na época. O atual secretário do Tesouro, Arno Augustin, jogou para a Receita a responsabilidade de comentar o assunto. "Quem fala sobre o assunto da Receita é a Receita." Ainda assim, o "chefe do cofre" ponderou que o governo "não está tomando nenhuma medida não usual do ponto de vista das programações".

Mantega evitou comentar a possibilidade de deixar parte dos pagamentos das restituições previstas este ano para o início de 2010, mas não descartou a possibilidade de que isso ocorra. "Não há regra rígida sobre isso." A Receita também evitou comentar o assunto, mas informou que não existe lei que obrigue o pagamento da restituição no mesmo ano de entrega da declaração. Segundo o ministro, se houver recuperação na arrecadação até o fim do ano, o governo poderá acelerar o pagamento das restituições.

Além das devoluções previstas para o próximo dia 15, a programação da Receita prevê dois novos lotes de restituição neste ano - nos dias 16 de novembro e 15 de dezembro. Mas nem o valor nem o número de contribuintes que serão incluídos nesses lotes estão definidos.

O ministro negou que o represamento das restituições do IR possa ser interpretado como uma mudança no foco de atuação da Receita Federal, que estaria passando a fiscalizar mais a classe média. "Não tem procedência achar que mudamos o foco. Os grandes contribuintes são sempre o nosso foco, até porque é mais fácil fiscalizar."

COLABORARAM ADRIANA FERNANDES E RENATA VERÍSSIMO