Título: Suspeito conta na PF que guardou Enem na cueca
Autor: Pompeu, Sergio
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/10/2009, Vida&, p. A16

Esquema de furto da prova foi simples e envolveu 3 pessoas; relatório indicará as falhas na segurança

A Polícia Federal está preparando relatório sobre falhas no esquema de segurança do consórcio responsável pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). O relatório será encaminhado ao Ministério da Educação com sugestões para evitar vazamentos como o que levou ao cancelamento da prova, no dia 1º. O superintendente em exercício da PF em São Paulo, Fernando Duran Poch, explicou que a meta é fornecer "subsídios de forma detalhada" ao ministério. "O MEC poderá melhorar controles nos próximos concursos", destacou. "A fragilidade foi da empresa contratada, que ganhou a licitação. Não houve fragilidade do governo."

Dois rapazes, de 20 e 21 anos, tiraram nos dias 21 e 22 de setembro os cadernos de prova da gráfica onde foram impressos. Um deles levou o exame na cueca; o outro, enrolado em uma blusa. Nenhum dos dois foi revistado. Para a PF, o furto não exigiu esquemas mirabolantes nem muito planejamento do suposto mentor da ação, Felipe Pradella, de 32, contratado pelo consórcio Connasel para fazer a conferência, manuseio e embalagem dos cadernos, impressos na Gráfica Plural. "Ele percebeu certa fragilidade no esquema de segurança e recorreu a dois amigos (para o furto)", disse ontem o delegado de Repressão a Crimes Fazendários, Marcelo Sabadin Baltazar, que coordenou a força-tarefa da PF.

Os "amigos" são Marcelo Sena, de 20 anos, e Felipe Ribeiro, de 21, que também foram contratados pelo Instituto Cetro, uma das empresas do consórcio, para trabalhar por dez dias. Receberiam R$ 600 cada um. Os furtos aconteceram nos dias 21 e 22, uma semana antes de Pradella ter procurado o Estado para oferecer o exame, por R$ 500 mil. O Estado comunicou imediatamente o caso ao ministro Fernando Haddad (Educação).

No dia 21, Pradella convenceu Ribeiro a retirar da área de impressão da gráfica o caderno 1 do Enem - com 90 questões que seriam respondidas no sábado por 4,1 milhões de candidatos - e sair com ele escondido na calça. No dia seguinte, Pradella "sentiu-se mais confortável". Surrupiou ele mesmo o caderno 2 da prova de domingo. Levou o exame para uma área de estoque de material da Plural e o escondeu na blusa de Sena. Coube a Sena sair com a "encomenda" da gráfica e guardá-la no carro de Pradella.

"Temos imagens dele indo até o carro", disse o delegado, referindo-se às gravações do circuito interno de TV da Plural. A PF divulgou trechos das gravações, parte de um lote de 136 cópias de DVDs repassado pela Plural. "A saída de dois cadernos já é um indício forte dessa fragilidade", disse Sabadin.

Na avaliação da PF, amadores desviaram o exame. Fernando Duran foi categórico. "Não há motivação política alguma, o que há é um grupo que cometeu um crime comum."

O Connasel deve se manifestar hoje sobre as afirmações da PF. Além dos três contratados pelo consórcio, a PF indiciou o DJ Gregory Camillo, de 26 anos, e o empresário Luciano Rodrigues, que trabalhou durante 15 anos na área comercial da Agência Estado. Segundo a PF, Pradella e os outros implicados disseram que Rodrigues "simplesmente passou os contatos da imprensa".

"Primeiro a PF tem de provar", declarou a advogada Claudete Pinheiro, que defende Pradella. "O grande pecado da gráfica foi instalar um excelente sistema de imagens, mas sem monitoramento. As imagens mostram que outras pessoas colocaram as provas sob as roupas."