Título: Incerteza jurídica atraiu sem-terra à região
Autor: Tomazela, José Maria
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/10/2009, Nacional, p. A4

Documentos do Incra indicam área pública ocupada indevidamente A escolha do novo campo de batalha do MST não é aleatória. Assim como ocorreu no Pontal do Paranapanema, uma das principais razões que levam o movimento a concentrar forças naquela área, nos arredores dos municípios de Iaras e Borebi, é a incerteza a respeito dos títulos de propriedade. De acordo com documentos reunidos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), trata-se de uma área pública, que estaria sendo ocupada indevidamente por particulares. O caso está sendo discutido há décadas na Justiça, fato que acaba gerando um clima de incertezas e insegurança.

A segunda razão motivadora do MST é o tamanho da área: são quase 40 mil hectares, o que daria para assentar cerca de 2.500 famílias - o equivalente a dez mil pessoas.

O terceiro motivo é o fato de tratar-se de uma região privilegiada, do ponto de vista geográfico. O município de Iaras fica às margens da Rodovia Castelo Branco, uma das principais veias de circulação de riquezas do interior paulista, com fácil acesso à capital. Instalar-se ali tem enorme importância para o MST, que critica o fato de a maioria dos assentamentos da reforma agrária ser feita em regiões de difícil acesso, especialmente no Norte do País.

Há que se considerar por último o fato de já existirem no local dois grandes assentamentos federais, controlados pelo MST. Essa proximidade favorece as ações dos sem-terra. Normalmente, as famílias assentadas dão apoio logístico às que ainda estão acampadas, à espera de seus lotes.

IMPACTO

O movimento opera naquela região há quase 15 anos. Nenhuma ação havia tido tanto destaque, porém, quanto a destruição dos laranjais - filmada pela Polícia Militar e exibida pela TV.

O impacto negativo das imagens foi tamanho que no interior do próprio MST há quem acredite que foi um desserviço à causa da reforma agrária. Ao se manifestar sobre o episódio, dias após a divulgação das imagens, a direção nacional do movimento chegou a mencionar a ocorrência de desvios de conduta na ocupação, mas logo passou a culpa adiante: "Em geral eles têm acontecido por causa da infiltração dos inimigos da reforma agrária, seja dos latifundiários ou da polícia."

No Congresso, a bancada ruralista utilizou o fato para tentar levantar a já moribunda CPI destinada a investigar as ações do MST. No governo federal ninguém saiu em defesa da ação de destruição do laranjal do grupo Cutrale - maior produtor de suco de laranja do mundo. Até o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que em 2003, primeiro ano de seu governo, vestiu o boné vermelho da militância dos sem-terra, sentiu-se na obrigação de condenar o ato.

Entre os aliados que saíram em defesa do MST quem se destacou foi a Comissão Pastoral da Terra, organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). "A ação do MST, por mais radical que possa parecer, escancara aos olhos da Nação a realidade brasileira. Enquanto milhares de famílias sem terra continuam acampadas Brasil afora, grandes empresas praticam a grilagem", disse a CPT em nota oficial.