Título: Como poupar R$ 15 bilhões na banda larga
Autor: Siqueira, Ethevaldo
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/10/2009, Economia, p. B9

Felizmente, o bom senso ainda pode prevalecer. Até há três dias, tudo indicava que a tese estatizante iria prevalecer no Plano Nacional de Universalização da Banda Larga. A nova esperança surgiu na quinta-feira passada, com a reunião promovida pelo ministro das Comunicações, Hélio Costa, com os presidentes das maiores operadoras de telecomunicações - Oi, Embratel, Telefônica, TIM e Claro - convidando-as a oferecer, no prazo de 30 dias, um plano alternativo de banda larga, com investimentos privados, e aproveitando ao máximo a vasta infraestrutura de cabos ópticos e sem fio das teles, em lugar de implantar uma nova rede, com a reativação da Telebrás.

A tese estatal de reativação da Telebrás parecia vitoriosa dentro do governo. Num lobby interno e com argumentos puramente ideológicos, um grupo de funcionários do segundo escalão liderados por Rogério Santanna, secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, vinha defendendo há cerca de um ano a reativação da Telebrás, para que a velha estatal viesse assumir, sem a participação das empresas privadas, a coordenação e a operação da futura Rede Nacional de Banda Larga.

O curioso é que esse lobby dentro do governo não tem atuado apenas com balões de ensaio, mas com declarações extemporâneas que provocam variações brutais na cotação das ações da Telebrás. Seria oportuno saber quem está lucrando com essa manipulação de ações.

Como a rede de cabos de fibra óptica da Petrobrás, Furnas e da falida Eletronet não tem capilaridade suficiente para interligar os 5.564 municípios brasileiros, o governo federal teria que investir muitos bilhões com esse objetivo.

R$ 15 BILHÕES

Em resumo: o País poderia desperdiçar no mínimo R$ 3 bilhões. Ou muito mais, pois o montante de R$ 3 bilhões não passa de um chute de Rogério Santanna, o mesmo cavalheiro que havia previsto há uma semana a necessidade de apenas R$ 1,1 bilhão para dar maior capilaridade à rede.

O custo mais provável de um projeto dessas dimensões poderá chegar a R$ 15 bilhões, estimam os especialistas. O ministro Hélio Costa estimou em R$ 10 bilhões os investimentos a serem feitos na infraestrutura de fibras ópticas das estatais para levar a banda larga ao interior do País - interligando escolas, hospitais, postos de saúde e delegacias de polícia. "O governo não tem esse dinheiro", disse.

Como o Brasil dispõe hoje de mais de 200 milhões de telefones, entre fixos e celulares, e uma vasta infraestrutura de redes fixas e móveis, de satélites, de cabos metálicos e fibras ópticas, a operação física de um projeto nacional de inclusão digital poderia ser feito pela iniciativa privada, sem necessidade de grandes investimentos governamentais.

CAPILARIDADE

Por maior que seja, no entanto, essa infraestrutura privada também não tem a capilaridade necessária para alcançar todos os municípios num projeto nacional de inclusão digital. Para ramificá-la e levá-la até a zona rural de muitas regiões, o melhor modelo seria o de parceria público-privada (PPP), do esforço conjunto do governo e das teles, integrando as redes de operadoras com as redes estatais.

Na primeira reunião do chamado Comitê Gestor do Programa de Inclusão Digital, realizado na segunda-feira passada, com a presença do presidente Lula e dos ministros Paulo Bernardo, do Planejamento, Dilma Rousseff, da Casa Civil, e Hélio Costa, para debater as linhas gerais do Plano Nacional de Universalização da Banda Larga, a única sugestão abrangente foi de Rogério Santanna, defendendo a reativação da Telebrás, não apenas para participar da inclusão digital, mas para prestar serviços de telecomunicações ao governo e a todas as suas empresas. A princípio, Lula pareceu entusiasmado, mas, quando lhe disseram, no dia seguinte, que os investimentos na infraestrutura poderiam chegar a R$ 3 bilhões, ele pediu um plano alternativo.

SEM MILAGRE

Isoladamente, a rede de banda larga não faz milagre. Ela é apenas uma parte da solução do problema educacional e da própria inclusão digital. De nada valerá contar com a melhor rede, se o governo não fizer sua lição de casa, se não investir pesadamente em educação, em especial no treinamento e na atualização permanente dos professores, na adequação de currículos, na modernização e na melhoria das escolas, inclusive nos terminais e equipamentos de banda larga, para que o País possa utilizar da melhor forma possível a oferta de internet de alta velocidade.

PAPEL DO ESTADO

O governo Lula parece não compreender, entretanto, que, em telecomunicações, o verdadeiro papel do Estado engloba tarefas muito mais nobres, como regular, elaborar políticas públicas e programas, fixar normas, estabelecer metas e objetivos, negociar a participação de todas as empresas operadoras ou teles, integrar a infraestrutura existente, conduzir parcerias público-privadas, fiscalizar tudo com o maior rigor e estimular as empresas privadas a inovar e a investir permanentemente nos diversos segmentos desse mundo digital.