Título: Inconfidente revela na BA 2 mil processos no porão
Autor: Gallucci, Mariângela ; Recondo, Felipe
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/10/2009, Nacional, p. A8

Servidores fazem cada vez mais denúncias ao conselho

Um fenômeno inimaginável até a criação do CNJ foi detectado recentemente por juízes que trabalham na corregedoria e participam das inspeções nas varas e tribunais de todo o País. Há cada vez mais juízes e funcionários dispostos a revelar irregularidades nos tribunais em que atuam.

Antes de iniciar as inspeções, o conselho avisa ao TJ que vai analisar os processos que tramitam no Estado. Os juízes responsáveis pelas inspeções nunca encontraram magistrados que tentassem impedir os trabalhos, mas já se depararam com manobras para maquiar a realidade.

No Juizado Especial de Salvador (BA), com base em análise prévia, os juízes do CNJ deram pela falta de 2 mil processos. Andaram pelas instalações do tribunal, vasculharam armários e gavetas, sem sucesso. Um encontro no corredor, contudo, resolveu o mistério. Um funcionário passou rapidamente pelos juízes da corregedoria e, tentando disfarçar, disse apenas: "Porão, porão!"

Os homens do CNJ entenderam o recado. Perguntaram se havia um porão no juizado e pediram para vasculhá-lo. Estavam lá os 2 mil processos. O tibunal achou que podia disfarçar a produtividade que não tinha escondendo os processos no porão.

Numa inspeção em Alagoas, os juízes do CNJ foram avisados pela servidora que servia cafezinho que ela era terceirizada, mas constava da folha de pagamento do tribunal - era uma laranja, mas não foi descoberto quem sacava o dinheiro em seu nome.

As inspeções do CNJ têm permitido chegar a uma conclusão comum: enquanto falta mão de obra na primeira instância, sobram funcionários comissionados em gabinetes de desembargadores. Outro problema está nas comarcas do interior, onde os juízes, que normalmente moram na capital, dão expediente em apenas três dias. São os chamados "juízes TQQ", uma alusão a terça, quarta e quinta-feira.

Mas não é preciso ir longe para encontrar aberrações. Em Brasília, a poucos quilômetros de distância de sua sede, o CNJ constatou no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (DF e mais 13 Estados) que 20% dos processos criminais em tramitação já estavam prescritos sem sequer serem apreciados pelos relatores.

No Maranhão, além das constatações de praxe, como atrasos em processos e casos de desvio de conduta, outro achado: havia mais de 140 policiais militares destacados exclusivamente para prestar serviços aos desembargadores - alguns davam expediente até nas casas dos magistrados.