Título: Gripe suína fortalece movimento antivacina
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/10/2009, Vida&, p. A26

Para grupo dos EUA, imunização pode ser mais perigosa do que vírus

As pessoas que não creem na eficácia da vacinação infantil nunca exerceram muita influência sobre Leslie Arndt. Ela disse ter estudado o assunto e decidido vacinar a filha de 10 meses contra doenças infantis. Mas há algo diferente a respeito da vacina contra a gripe suína, diz ela. "Analisei os argumentos daqueles que são contrários e descobri que tomo o partido deles", disse Leslie, residente de Portland, Oregon (EUA). "Ainda assim, mudo de opinião a respeito do assunto todos os dias. Trata-se de um tema que mexe com minhas emoções."

Faz anos que o grupo antivacinação, como é chamado por cientistas e médicos, vive à margem da medicina. Mas uma conjunção de fatores envolvendo a vacina contra a gripe suína - entre eles a falta de clareza quanto ao seu processo de produção, especulações quanto à possibilidade de a vacina ser mais perigosa do que o vírus e queixas de alguns funcionários do sistema de saúde de Nova York contra a obrigatoriedade de serem vacinados - está fornecendo novos argumentos ao movimento antivacinação, de acordo com especialistas na área da saúde.

"No momento, a atenção do país está muito voltada para essa vacina", diz Thomas Farley, comissário do sistema de saúde de Nova York. Essa atenção conferiu aos opositores "uma oportunidade para se manifestarem publicamente e amplificar a sua mensagem, chance que eles não tiveram antes". Barbara Loe Fisher, presidente do Centro Nacional de Informações sobre Vacinas, que questiona a segurança das vacinas, disse que a gripe suína "deu à causa um novo ânimo". "Pessoas que nunca questionaram a vacinação estão desconfiadas."

Esse aumento no interesse é frustrante para os funcionários do sistema de saúde, que enfrentam dificuldades para convencer um público já desconfiado a formar filas para receber injeções, evitando que a pandemia se espalhe. De acordo com uma pesquisa de opinião realizada pela CBS News na semana passada, apenas 46% dos participantes se disseram dispostos a tomar a vacina. A pesquisa, de alcance nacional e margem de erro de 3%, revelou que, apesar de 6 em cada 10 pais terem dito que provavelmente vacinariam seus filhos, apenas 46% deles afirmaram que a probabilidade de se submeterem à vacinação era "muito grande".

"Me pergunto se as pessoas que disseminam tais informações falsas sobre essa vacina percebem que sua atitude pode custar vidas", disse Jonathan E. Fielding, diretor do Departamento de Saúde Pública de Los Angeles. Os comentários feitos por aqueles que se opõem à vacina, "tanto os de esquerda quanto os de direita", diz ele, são com frequência "não apenas contraproducentes, mas simplesmente vergonhosos".

CÉTICOS

Páginas na internet, microblogs do Twitter, programas de rádio e até conversas de elevador estão repletos de céticos que desmerecem a vacina, na maioria dos casos sem nenhuma base factual nem científica. A queixa mais comum está relacionada ao fato de a vacina ter sido elaborada recentemente e distribuída rapidamente sem ser submetida aos devidos testes clínicos; na verdade, a vacina contra a gripe suína foi feita a partir das mesmas técnicas usadas na fabricação da vacina contra a gripe sazonal ao longo das últimas duas décadas e um pequeno número de testes clínicos foi realizado este ano para determinar a dosagem.

Afirma-se também que a vacina contém elementos coadjuvantes - acrescentados para aumentar a eficácia das vacinas -, apesar de essa técnica não ter sido empregada neste caso.

Além disso, existe o medo de que a vacina provoque um surto da Síndrome de Guillain-Barre, como se suspeita que tenha ocorrido na última vez que uma vacina contra gripe suína foi distribuída, em 1976; vacinas contra gripe são hoje muito mais puras, minimizando tal risco, e a Síndrome de Guillain-Barre tornou-se substancialmente mais rara.

Na avaliação do risco representado pela vacina, há um consenso generalizado entre os médicos segundo o qual reações adversas graves são muito raras, e as grávidas e os mais jovens, em especial, estarão melhor protegidos se aceitarem a vacina. Apesar de a maioria das pessoas que contraem o H1N1 apresentar apenas sintomas leves, um estudo recente do The New England Journal of Medicine mostrou que entre os americanos hospitalizados em decorrência da gripe suína no semestre passado, um em cada quatro acabou na terapia intensiva e 7% deles morreram.

A doença, diferente de outras cepas da gripe, mostrou-se especialmente grave para crianças e jovens adultos e a proporção de casos fatais parece muito alta entre as grávidas. Até o momento, 76 crianças morreram em decorrência do vírus, de acordo com os Centros para o Controle e Prevenção de Doenças.

Funcionários do sistema de saúde estão preocupados com a possibilidade de alguns grupos, principalmente as grávidas, serem convencidos pela escala das iniciativas dos opositores da vacinação. "Entre os aspectos que têm recebido maior atenção desses funcionários estão a imunização e a gravidez", disse Saad B. Olmer, professor assistente de saúde global na Escola de Saúde Pública Rollins, da Universidade Emory. "A aceitação da vacina entre as grávidas parece ser baixa neste caso, o que poderia ter um grave impacto, pois elas apresentam grande risco de complicações no caso de contraírem a gripe."

NO BRASIL

A designer Ana Basaglia prefere não vacinar os três filhos. "Estudo bem cada doença e avalio qual é o melhor tratamento", afirma. "No caso das vacinas, creio que o benefício muitas vezes não compensa o risco inerente à imunização." Ela aponta que raramente se comentam os possíveis efeitos adversos da vacina. Ana sublinha que conta com o acompanhamento do pediatra, que também é adepto da homeopatia. Ela participa de um grupo de discussão na internet crítico aos programas de vacinação que conta com cerca de 370 associados.