Título: Rotina esvazia ações de Zelaya
Autor: Pedrosa, Wilson ; Simon, Roberto
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/10/2009, Internacional, p. A10

Abandono da casa por jornalistas reduz força política de líder deposto

O longo impasse a que chegou a crise hondurenha está, pouco a pouco, esvaziando a Embaixada do Brasil em Tegucigalpa, onde o presidente deposto Manuel Zelaya está abrigado desde o dia 21. Há duas semanas, oito zelaystas deixaram a missão. Nos últimos sete dias, mais quatro abandonaram o barco. A estagnação das negociações somada ao "êxodo" da embaixada ameaçam retirar Zelaya do foco das atenções, sobretudo da mídia internacional.

Com menos gente e com a tendência de os jornalistas também partirem, o campo zelaysta começa a temer perder voz e, consequentemente, a capacidade de mobilização. Na medida em que os dias passam e a solução negociada para a crise parece mais distante, amplia-se a percepção, principalmente entre os repórteres, que o assunto começa causar um certo fastio - e, consequentemente, o desinteresse - em seus leitores e espectadores.

O eventual esvaziamento da mansão mostraria que a estratégia do governo de facto de, por um lado, arrastar ao máximo as negociações e, por outro, reforçar a pressão psicológica sobre os que continuam na embaixada, está funcionando.

O inesperado retorno do presidente deposto a Honduras causou violentos distúrbios em Tegucigalpa. Em meio à dura repressão da polícia e do Exército, cerca de 300 zelaystas em fuga buscaram abrigo na missão brasileira.

Negociações entre autoridades internacionais e o governo de facto de Roberto Micheletti foram capazes de baixar a cifra, no fim de setembro, para pouco menos de 70 "hóspedes". Hoje, a lista de pessoas abrigadas soma 48 nomes, dos quais 6 são de repórteres de jornais e agências de notícia internacionais.

INDEFINIÇÃO

Todas as vias de acesso à missão brasileira na capital hondurenha estão fechadas por barricadas. Só a Organização das Nações Unidas (ONU) tem acesso ao sobrado da embaixada três vezes ao dia, quando leva suprimentos às dezenas de pessoas lá abrigadas. Em volta da casa, soldados instalaram gruas e plataformas, de onde ameaçam diariamente com armas de fogo os ocupantes. Foram instalados também equipamentos que emitem ininterruptamente som de animais.

Há dez dias representantes do governo de facto e do presidente deposto negociam os 12 pontos previstos pela Proposta de San José, o plano de paz elaborado em julho pelo presidente costa-riquenho, Oscar Arias. Todos os temas previstos pelo texto já foram acertados, à exceção do principal: a restituição de Zelaya.

Micheletti afirma que a restituição é de ordem "jurídica" e, portanto, deve ser submetida à Suprema Corte. Zelaya recusa a exigência. Ele afirmou ao Estado na sexta-feira que o tribunal superior foi "parte integrante" do golpe e agora exige que o tema, supostamente de cunho "político", seja decidido pelo Congresso, no qual teria maioria. O impasse fez com que os prazos impostos por zelaystas expirassem, alongando indefinidamente a crise. Os dois lados voltam a se encontrar hoje.

A CRISE EM NÚMEROS

144 dias

é o tempo de duração do impasse, desde a derrubada do presidente Manuel Zelaya, em 28 de junho

300 "hóspedes"

estavam na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa desde que Zelaya chegou ao local, em 21/9 48 pessoas estão na missão brasileirahoje, dos quais 6 são jornalistas e 1 é funcionário do Itamaraty

4 zelaystas

deixaram o local

nesta semana