Título: Gestão das exportações agroindustriais
Autor: Lopes, Mauro de Rezende
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/10/2009, Economia, p. B2

No setor agroindustrial, de tudo o que o Brasil produz, em termos de valor, cerca de 30% são exportados. O País depende do mercado externo para sustentar a renda do setor. O desempenho das exportações é uma boa medida da saúde financeira da agroindústria brasileira. A apreciação do real causou um grande estrago nas exportações do País, apesar de o Banco Central ter comprado, em um só dia, US$ 5 bilhões para "segurar" o câmbio. De um total dos 25 produtos mais importantes da pauta de exportações, apenas 8 não sofreram grandes reduções nos valores exportados. De janeiro a agosto de 2009, comparando-se com o mesmo período do ano anterior, as maiores quedas no valor das vendas externas foram: óleo de soja (-47%); couros e peles (-42,9%); álcool (-40,5%); produtos florestais (-29,5%); carne suína (-26,7%); carne bovina (-26,1%); carne de frango (-22,1%); complexo carnes (-23,6%); café (-5,6%), apenas para citar os casos mais importantes. Em razão dos montantes das quedas, esses resultados acenderam uma luz vermelha nos controles financeiros das cooperativas.

Esse choque de realidade desencadeou um conjunto de mesas-redondas entre dirigentes cooperativistas das Regiões Sul e Sudeste para discutir a crise, uma vez que a tendência é de uma defasagem cambial ainda maior. Conduzimos uma pesquisa sobre a disposição dos dirigentes cooperativistas de enfrentar essa difícil travessia. Tal não foi nossa surpresa que essa disposição era de promover um choque de gestão, partindo do reconhecimento de que as dimensões da crise eram maiores do que as soluções do passado podiam resolver.

Um ponto inicial era o reconhecimento de que estava em curso um processo de seleção darwiniana - só sobreviveriam a essa travessia as cooperativas com alto grau de adaptabilidade. Isso ficou claro com a liquidação de uma grande cooperativa em Mato Grosso do Sul - fato que não se conhecia no passado. Ou a cooperativa se adapta ou perece. Por se adaptar entende-se a adoção de elevados padrões de governança corporativa, por exemplo. Reconhecem os dirigentes do setor - em manifestações espontâneas durante a pesquisa - que está clara a preocupação com essa governança - ou seja, a divisão das tarefas entre a Assembleia-Geral, o Conselho de Administração, a Diretoria, o Conselho Fiscal e os Comitês Educativos. Os dirigentes cooperativistas acreditam que passou o tempo dos presidentes que manipulavam todas as instâncias decisórias, colocando "pessoas de confiança" em cada uma delas e em todas. Um presidente entrevistado pela pesquisa disse: "Sem respeito pelas esferas de decisão a cooperativa fica "opaca", perde transparência. E não podemos comprar nem vender nada no mercado." Transparência era a terceira maior preocupação dos entrevistados.

A pesquisa revelou ainda que os presidentes das cooperativas desejam aprender a negociar passivos onerosos - aqueles para os quais não há ativos em contrapartida. Essa é uma nova atitude, pois no passado os presidentes não se importavam tanto assim com a assimetria do conhecimento - com os bancos e os seus funcionários sabendo tudo de como se defender desse tipo de cliente, com seus passivos onerosos, e os presidentes com uma atitude bastante ingênua em relação a uma negociação complicada. As nossas pesquisas mostram a adoção de uma atitude diferente por parte dos dirigentes de cooperativas do Sudeste e do Sul.

Outro ponto importante foi a constatação dos dirigentes de que, "quando não resolvemos um problema que é típico da porteira da cooperativa para fora, ele "explode" da porta da cooperativa para dentro". Grande parte do rompimento do tecido cooperativo vem do fato de que não somos capazes de resolver empreendimentos associativos com cooperativas vizinhas. De fato não há sentido em se ter, a cada 30 km, uma cooperativa que produz 30 mil litros de leite. As cooperativas remanescentes, que são muito numerosas, instaladas a cada 30 km levará o sistema da pecuária leiteira, por falta de escala, à ruína. Outra frase muito importante que mostra uma "virada": "A prosperidade da minha cooperativa depende da prosperidade da cooperativa vizinha." Essas frases são importantes.

*Mauro de Rezende Lopes é pesquisador do Centro de Estudos Agrícolas, do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas (RJ).