Título: Advogado avalia censura como um absurdo jurídico
Autor: Assunção, Moacir
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/10/2009, Nacional, p. A6

Especialista em direito constitucional diz que decisão mostra uma "confusão em termos de sigilo judicial"

O advogado constitucionalista e professor de direito constitucional na Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), Pedro Estevam Serrano, considera que há uma grande confusão em termos de sigilo judicial na decisão segundo a qual o Estado está proibido, desde 31 de julho, de publicar informações sobre a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, que investigou Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). "O sigilo judicial é uma obrigação do poder público, que ele não pode transferir para a sociedade. Ao mesmo tempo que guardar o sigilo é obrigação dos funcionários do Estado, a dos jornalistas é investigar e publicar o que for obtido. Isso para mim parece primário", explicou.

Exigir que um jornalista guarde sigilo sobre investigações de interesse público, segundo ele, equivale a pedir que o advogado denuncie seu cliente ou ao padre que entregue à Justiça o fiel que se confessou na sacristia. "Ora, as funções do jornalista e advogado existem exatamente para impor limites, e se for o caso, contestar o poder do Estado. Caso isso não ocorra, o governo passa a gozar de um poder imperial, absoluto, que conspira contra o sistema democrático. Seria como se vivêssemos numa ditadura."

Para o professor, a censura determinada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que vê como absurdo jurídico, se constitui como uma espécie de resíduo do sistema autoritário que sobreviveu ao fim da ditadura militar. "A decisão é inconstitucional, profundamente criticável. A Constituição deixa muito claro que nenhuma ação pode obstar a livre circulação da informação, que é um patrimônio público."

Ele sugere uma lei vedando expressamente a censura prévia, o que, em sua visão, tornaria claros os limites dos poderes em casos semelhantes. Por todo o País, decisões de juízes de primeira instância têm determinado a censura de jornais a pedido de prefeitos, deputados e empresários. "Parece que não está muito claro que não pode haver censura, apesar de a Constituição vedá-la expressamente. A legislação tiraria qualquer dúvida, até para balizar o trabalho dos juízes."

O fato de a censura ter sido imposta por liminar é tão grave quanto o próprio ato, em sua opinião. "Assim como as Medidas Provisórias que permitem ao presidente governar por decreto essas liminares são traços do poder imperial concedido aos entes públicos."