Título: Terapia gênica recupera visão de pessoas com cegueira rara
Autor: Afp
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/10/2009, Vida&, p. A13

Crianças reagem melhor ao tratamento; esperança é aplicar técnica para outras doenças

A terapia gênica permitiu que um grupo de pesquisadores obtivesse uma melhora considerável na visão de crianças que sofrem de amaurose congênita de Leber (ACL), uma doença hereditária grave que, na maioria das vezes, leva à cegueira.

Os experimentos foram realizados em outubro de 2007 e envolveram 12 pacientes com idades entre 8 e 44 anos de países como Estados Unidos, Bélgica e Itália. A visão melhorou em todos, segundo estudo publicado no sábado na versão digital da revista científica The Lancet.

Nas crianças, os resultados foram "espetaculares", na opinião dos pesquisadores, pois muitas conseguiram recuperar suficiente capacidade visual para caminhar sem ajuda. A melhora manteve-se até o momento atual.

Um garoto que, desde o nascimento, só conseguia captar luzes e sombras, pôde distinguir a cor dos olhos do pai e jogou futebol com ele pela primeira vez. Os resultados desses ensaios, dirigidos por Joan Bennett e uma equipe de cientistas da Escola de Medicina da Universidade da Pensilvânia, foram apresentados em um congresso de oftalmologistas em São Francisco, nos Estados Unidos.

"O trabalho é muito estimulante para todo o campo da terapia gênica", afirma Katherine High, coautora do estudo. Ela espera que o avanço permita acelerar o desenvolvimento de uma terapia gênica para enfermidades retinianas mais comuns, como a degeneração macular relacionada à idade, uma doença que afeta cerca de 5 milhões de brasileiros.

A DOENÇA

A ACL, na realidade, reúne um conjunto de doenças causadas por mutações em um grupo de 13 genes. É a forma mais severa de degeneração genética da retina (mais informações nesta página). Uma grande perda da visão desde os primeiros anos de vida e movimentos anormais dos olhos constituem os principais sintomas.

Normalmente, a perda da visão piora com o tempo e termina na cegueira total aos 30 ou 40 anos. Em um grupo de 80 mil pessoas, uma costuma desenvolver a doença.

A pesquisa centrou-se em uma forma rara de ACL, que os cientistas já haviam conseguido provocar em animais de laboratório. Antes de aplicar a terapia gênica nos voluntários, o método foi testado em cobaias.

O procedimento utilizou um vírus como vetor do material genético que substituiria os genes defeituosos. Os microrganismos foram injetados no olho em que a doença estava mais avançada. Bem tolerada pelos pacientes, a terapia não produziu cura total, mas melhorou em, no mínimo, cem vezes a resposta da pupila à luz.

"Os 12 voluntários apresentaram melhora da função retiniana", sublinharam os pesquisadores, que constataram que a resposta dependia da extensão da degeneração "e, portanto, da idade do paciente". Por isso, as quatro crianças tiveram os melhores resultados.

MACACOS

Há cerca de um mês, pesquisadores americanos conseguiram fazer com que macacos adultos com daltonismo percebessem novamente todas as cores. Utilizaram uma abordagem semelhante à usada para tratar a ACL em humanos. O estudo com os símios, publicado na revista Nature, trouxe esperança aos pesquisadores para investir no potencial da terapia gênica na resolução de problemas de visão em indivíduos adultos.