Título: Brasil adota modelo coreano, mas sem metas
Autor: Dantas, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/10/2009, Economia, p. B3

Embora seja inspirada no exemplo de países como a Coreia, a atual política industrial do governo Lula, de estímulos do Estado à consolidação de grandes grupos, não tem um elemento fundamental da estratégia asiática: as metas de desempenho por empresa, em itens como exportações e gastos com pesquisa e desenvolvimento (P&D).

A visão é de Mansueto Almeida, autor de um estudo sobre a política industrial brasileira. Ele acrescenta que as pressões do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre a Vale, por exemplo, são bem diferentes das metas coreanas.

"Lá, as metas eram públicas e objetivas, e determinadas antes da concessão dos subsídios, o que torna tudo muito mais transparente; na nossa política industrial, tanto a de 30 ou 40 anos atrás quanto a que está sendo retomada hoje, isso não existe", ele diz.

Para o economista, no Brasil, como não há condições claras no momento em que o Estado concede um crédito subsidiado ou faz um aporte de capital, num momento posterior o governo quer intervir de forma meio ad hoc. Isso, na sua opinião, "parece mais o criticado modelo de capitalismo de relações do que uma política industrial de estilo asiático".

Almeida nota que o segundo grande momento da política industrial de Lula, depois da Pitce (ver matéria ao lado), foi o lançamento da Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) em 2008. Segundo o economista, a PDP parece se basear numa ideia mais ampla de política industrial, que tenta contemplar simultaneamente o foco na inovação e na tecnologia e o fortalecimento dos setores tradicionais.

O problema, porém, para ele, é que só esse segundo objetivo parece estar sendo alcançado com a política de consolidação dos grandes grupos nacionais. A participação de produtos de média e alta tecnologia nas exportações brasileiras, por exemplo, recuou de 36% para 27% de 2000 a 2008 - o que foi impulsionado pela alta das commodities, mas ainda assim não aponta para um desempenho mais vibrante dos setores intensivos em tecnologia em termos de competitividade internacional.

Os grandes saldos comerciais ainda são obtidos por setores de baixa ou média-baixa tecnologia, como alimentos, bebidas e tabaco; produtos não industriais (minerais, produtos agrícolas, petróleo não-refinado, serviços de construção, e outros); produtos metálicos; e madeira, papel e celulose. Em 2008, os saldos daqueles setores foram de, respectivamente, US$ 31,3 bilhões, US$ 26 bilhões, US$ 11,2 bilhões e US$ 6,6 bilhões.

No trabalho, o economista aponta outros problemas da política industrial que busca a concentração do poder econômico com o apoio do Estado, como a formação de "oligopsônios" (reduzido número de compradores), que pode prejudicar o poder de barganha de pequenas e médias empresas no início das cadeias produtivas.