Título: Vício faz criança cobrar R$ 2 por sexo
Autor: Machado, Renato
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/11/2009, Metropole, p. C3

Na Dutra, há 37 pontos de possível exploração sexual, com destaque para áreas em que o abuso está ligado ao crack

O caminhão mal reduz a velocidade para entrar no posto de gasolina e algumas pessoas começam a caminhar ao lado da cabine, oferecendo sexo ao motorista. No meio delas, uma menina de pernas finas, vestindo uma saia colegial vermelha e jaqueta rosa com capuz, disputa espaço para fazer a oferta. Prostitutas e travestis dizem que os valores mais baixos são os dela e de outras seis ou sete menores de idade, que fazem programas no km 52 da Via Dutra, em Lorena, no Vale do Paraíba. Isso porque elas só precisam conseguir R$ 5 para depois andar 10 metros e comprar um "caroço" de crack.

A chegada da droga à cidade, há cerca de cinco anos, é apontada por policiais, comerciantes e integrantes do Conselho Tutelar como a principal causa para o aumento na exploração de menores. O trecho de Lorena sempre foi um conhecido ponto de prostituição. "Mas agora temos dificuldades com algumas menores que ficam na estrada, o que não havia antes", afirma Bitencourt Marins Neto, integrante do Conselho Tutelar. Marins Neto diz que há nesses grupos meninas de até 14 anos, recolhidas frequentemente pelas autoridades. "Elas não se encaixam nos casos de pessoas retiradas da família por causa de maus-tratos. Elas têm casa. Mas estão nessa situação por causa do vício."

O grupo de meninas passa as madrugadas reunido em frente a um posto de gasolina, esperando os caminhoneiros, ao lado de garotas de programa e travestis. Uma grande construção abandonada - que tem só telhado e pilares - também é usada como refúgio, principalmente para fumar crack. A reportagem do Estado permaneceu cerca de três horas na região, na madrugada de sexta-feira, período em que havia cerca de 15 pessoas oferecendo programas. Pelo menos quatro aparentavam ter menos de 18 anos.

Uma delas era Y, a menina de jaqueta rosa, que disse ter 17 anos. A maior parte do tempo ficou com o grupo na construção abandonada. No local escuro, de vez em quando pequenas luzes se acendiam, indicando o consumo de crack. Constantemente, as pessoas saíam de lá para oferecer programas para caminhoneiros. Após conseguir dinheiro, voltavam para consumir a droga.

"De uns cinco anos para cá, dificilmente passamos uma semana sem apreensão de crack", afirma o titular em exercício na Delegacia de Lorena, José Willy Giaconi Júnior.

Prostitutas e travestis reclamam das meninas mais novas e dos viciados. "Elas cobram até R$ 2, aquelas meninas sujas que nem tomam banho", conta uma garota de programa de 24 anos. Ela afirma que o grande consumo de drogas afugentou caminhoneiros que costumavam dormir no posto. Sua meia-irmã, menor de idade, também já faz programas, por causa do vício pelo crack. "Ela e as outras ficam brigando por clientes."

O mapeamento da PRF apontou 37 pontos de possível exploração de menores. Há garotas de programa e travestis nos trechos de São José dos Campos, Guaratinguetá e até da religiosa Aparecida. Os mais conhecidos são Lorena e Canas, onde em um posto param em média 50 caminhões por noite. As garotas de programa circulam entre os caminhões. Em média, o programa sai por R$ 20.