Título: Comunistas mudam sigla e seguem no poder
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/11/2009, Internacional, p. A18

Elite política romena e húngara ainda é a mesma dos tempos da ditadura

Metade dos 12 candidatos presidenciais da Romênia tem relações com o comunismo. Uma avaliação do Centro de Análise de Desenvolvimento Institucional (Cadi), de Bucareste, mostrou que, apesar da democracia, não houve renovação na política local. Como em muitos países do Leste Europeu, a elite política conseguiu sobreviver à transição e ocupa hoje um lugar de destaque. Agora, finalmente, a crise econômica está se incumbindo de varrer os ex-dirigentes comunistas do mapa.

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A escritora romena Herta Muller, que este ano ganhou o Prêmio Nobel de Literatura, diz que seu país mergulhou numa "amnésia coletiva" após a queda do ditador Nicolae Ceausescu, preso e executado no Natal de 1989. Herta, que em 1987 fugiu para a Alemanha, onde vive até hoje, afirma que 40% da classe política romena é composta de ex-funcionários da Securitate, o temido serviço secreto do regime comunista.

A morte de Ceausescu passou a ser alvo de uma série de teorias da conspiração, principalmente porque ninguém nunca encontrou sua fortuna, avaliada em US$ 4 bilhões. Por isso, dizem que não houve uma revolução, mas um golpe de Estado promovido pelo Kremlin e por comunistas romenos marginalizados pelo ditador.

Ceausescu era conhecido por desafiar Moscou. Ele foi condecorado por países europeus, principalmente após se declarar contra a invasão da Checoslováquia, em 1968. No fim dos anos 80, porém, a avaliação era outra. Ele teria obtido uma autonomia exagerada de Moscou e se recusava a adotar a abertura promovida pelo Kremlin.

Nos bastidores, os generais deixaram de apoiá-lo e opositores dentro do Partido Comunista Romeno (PCR) fizeram o resto do serviço. Ironicamente, sua queda permitiu que boa parte da elite comunista sobrevivesse em nova roupagem. Ion Iliescu, antigo membro do PC, que assumiu o poder em 1989, foi presidente por três mandatos e hoje vive sob a legenda do Partido Socialista. Em 1995, o jornal Ziua revelou que Iliescu foi agente da KGB.

O estudo do Cadi aponta que, durante as privatizações, nos anos 90, parte importante dos negócios foi feita por personalidades que faziam parte do regime comunista. O resultado é que, hoje, 500 pessoas controlam 20% da economia local, um dos maiores índices de concentração de renda da Europa. Um exemplo é o magnata da comunicação Dan Voiculescu, que trabalhou como informante da Securitate.

Na Hungria, o debate entre a velha e a nova elite também é acalorado. Deputados de direita, como Tamás Deutsch, dizem que se sentem frustrados ao ver no poder os mesmos nomes dos tempos de comunismo. A realidade, porém, é que a direita não conseguiu convencer o eleitorado de que pode fazer algo diferente.

Assim como na Romênia, as políticas dos governo de direita na Hungria também aumentaram as diferenças sociais. O resultado foi a volta ao poder dos comunistas, agora como "socialistas". Nos anos 90, os húngaros chegaram a eleger primeiro-ministro o último chanceler comunista, Gyula Horn.

Entre 2002 e 2004, a Hungria foi governada por Petes Medgyessy, ex-espião do regime. Entre 2004 e 2009, o premiê foi Ferenc Gyurcsány, ex-líder da Organização de Jovens Comunistas nos anos 80. Agora, com uma economia em crise, os partidos de direita voltam a ganhar espaço, pelo menos nas pesquisas de opinião.