Título: Aposentado terá de esperar por reajuste
Autor: Lopes, Eugênia ; Madueño, Denise
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/11/2009, Economia, p. B5

Manobra orientada pelo governo evitou votação da proposta, com trancamento da pauta pela MP do setor elétrico

Uma manobra orientada pelo governo evitou ontem a votação do projeto de lei que estende a todas as aposentadorias e pensões o mesmo índice de correção do salário mínimo. A estratégia foi concretizada pelo deputado João Carlos Bacelar (PR-BA), relator da medida provisória sobre o setor elétrico, com um pedido de prazo para analisar a proposta. A MP tranca a pauta e, sem sua votação, o projeto dos aposentados não pôde ser analisado. Com isso, a votação foi adiada indefinidamente. As próximas semanas na Câmara serão dedicadas à votação do marco regulatório do pré-sal.

Se aprovado, o projeto dos aposentados trará um impacto de R$ 6,9 bilhões no próximo ano nas contas da Previdência, além de elevar as despesas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para 18,1% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2050. A única solução seria o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que acabaria desgastando politicamente o governo. O temor do Palácio do Planalto é que o veto ao reajuste de aposentados e pensionistas também respingue na candidatura da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) à Presidência.

As galerias do plenário ficaram apinhadas de aposentados e pensionistas. A estimativa da polícia da Casa é que cerca de mil inativos foram à Câmara acompanhar a votação do projeto. Diante da manobra para adiar a votação da proposta, eles gritaram palavras de ordem, como "vota, vota" e xingaram deputados. Um dos mais vaiados foi o líder do PT, Candido Vaccarezza (SP), que começou seu discurso dizendo que se dirigia "ao povo brasileiro que apoia o presidente Lula".

"Se tiver o mesmo reajuste para todos, o salário mínimo não poderá mais ter os mesmos índices de aumento. Não será com propostas fáceis e às vezes demagógicas que vamos construir este país", argumentou Vaccarezza. Os aposentados e pensionistas ficaram de costas enquanto o líder petista discursava. Autor da emenda que concede os índices de aumento do mínimo às aposentadorias e pensões, o senador Paulo Paim (PT-RS) assistiu no plenário da Câmara aos discursos contrários e favoráveis à medida.

"O compromisso do nosso governo é negociar para trazer a plenário um projeto com avanços", disse o líder do governo na Câmara, deputado Henrique Fontana (PT-RS), ao lembrar que uma proposta alternativa está sendo negociada com as centrais que "não são pelegas".

Há cerca de dois meses, o governo propôs às centrais sindicais e às entidades dos aposentados um acordo para suspender a tramitação desse projeto e de mais duas propostas consideradas danosas para as contas da Previdência. Em troca, os aposentados que ganham mais de um salário mínimo receberiam em 2010 e 2011 reajuste de 6,1%, o que significaria ganho real de cerca de 2,5% em cada ano, considerando a variação prevista para o INPC, índice que corrige as aposentadorias.

Na sessão de ontem, a maioria dos líderes de partidos aliados ao governo Lula preferiu não se manifestar. Como a proposta tem grande potencial eleitoral, parlamentares da base já avisaram ao Planalto que votariam a favor dos aposentados, caso o projeto fosse a plenário. Já a oposição aproveitou para criticar o governo.

"A não votação do projeto é uma demonstração da enganação do governo Lula. Quando o relator pediu prazo foi a mando do governo", disse o líder do PPS, deputado Fernando Coruja (SC).