Título: Ação guerreira contra Belo Monte
Autor: Andrade, Renato ; Goy, Leonardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/11/2009, Economia, p. B7

Índios interrompem travessia de balsa no Xingu e enviam carta a Lula protestando contra a obra

Com a presença do cacique Raoni Metuktire, conhecido em todo o mundo, lideranças indígenas anteciparam o protesto previsto para hoje contra a construção da Hidrelétrica de Belo Monte e interromperam ontem, por cinco horas, a travessia por balsa do Rio Xingu, que liga São José do Xingu a outros municípios de Mato Grosso e ao Pará. Cerca de 50 caminhões de boiadeiros foram impedidos de passar.

A suspensão será retomada hoje, às 7 horas, e deve ser mantida pelo menos até o encerramento do encontro, também hoje, em Brasília, para discutir "direitos indígenas". Raoni, que viajou ontem para Redenção (PA), participou das manifestações acompanhado do líder Megaron Txucarramãe. Raoni se mostrou preocupado com a obra. "É bom o rio quieto em seu leito e sem barragens."

Os protestos fazem parte do calendário dos povos do Xingu que recomeçaram no segundo semestre com a manifestação na Aldeia Piaraçu, na terra indígena Kapot/Jarina, na semana passada, contra a construção da usina.

Em carta que será entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, assinada por cerca de 300 lideranças, os índios ameaçam com "ação guerreira" caso o governo não desista do projeto da hidrelétrica.

Na quinta-feira, está prevista um encontro na Vila Roçada, município de Senador José Porfírio (PA), que reunirá lideranças indígenas, moradores ribeirinhos, procuradores da República, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e advogados.

Mesmo sem ter obtido nenhuma das três licenças necessárias (a prévia, de instalação e de operação), o empreendimento deve ser oferecido em leilão em dezembro, segundo informação do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão.

No documento que será entregue ao presidente Lula, eles questionam a forma como o processo de licenciamento vem sendo conduzido pelo governo e reclamam da falta de diálogo com os povos indígenas que, segundo eles, "não teriam sido ouvidos nem recebido as informações a que têm direito".

Na carta, dizem também que não aceitam que "o governo tome uma decisão de tamanha irresponsabilidade, que trará consequências irreversíveis para essa região e nossos povos, desrespeitando profundamente os habitantes ancestrais deste rio e o modelo de desenvolvimento que defendemos".

Há cerca de duas semanas, a Fundação Nacional do Índio (Funai), órgão do governo, emitiu parecer favorável no que concerne à avaliação do componente indígena dos Estudos de Impacto Ambiental (EIA) da obra.

A comitiva indígena exige uma reunião com o presidente do órgão, Mercio Meira, para "cobrar explicações sobre esse parecer, que contraria a opinião das 283 lideranças indígenas presentes no encontro".

Os questionamento à obra incluem aspectos técnicos, socioambientais e de viabilidade econômica. Segundo o projeto, dadas as condições de cheia e vazante, o aproveitamento em parte do ano não ultrapassaria os 40% dos 11.233 MW instalados.