Título: Câmbio e excesso de liquidez
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/11/2009, Economia, p. B2

O IGP-DI da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em 12 meses até outubro, foi o menor da história desse índice para o período desde que ele foi criado em 1944, em razão, basicamente, dos preços no atacado. A forte valorização do real ante o dólar permitiu uma redução nos preços dos produtos importados, fossem matérias-primas, componentes ou produtos acabados.

Isso mostra a importância da taxa cambial no controle da inflação e dá maior destaque à entrevista que o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, deu em Londres quando declarou que "há entusiasmo incontido no câmbio", atribuindo-o mais ao clima psicológico decorrente da habilidade com que o Brasil saiu da crise internacional do que apenas à forte entrada de divisas.

Meirelles considera que o BC atuou adequadamente no mercado cambial fornecendo divisas quando a moeda nacional estava se desvalorizando ou intervindo no mercado futuro e tornando-se um forte comprador nos momentos de excessiva valorização, sem descartar, todavia, uma modificação da política cambial elaborada em tempo de escassez de moedas estrangeiras.

Pode-se concluir dessa análise que o BC estaria pronto para intervir no mercado cambial se houver uma desvalorização que ele julgue excessiva e, desse modo, estaria apto a controlar os riscos de um retorno da inflação.

No entanto, o presidente do BC deixa transparecer na sua análise uma certa insatisfação no que se refere às causas da valorização da moeda nacional, que não pode ser atribuída apenas à grande oferta de divisas e ao efeito de manada que se manifesta no mercado cambial.

Existe um ponto na sua entrevista que nos deixa preocupados, quando afirma com toda a tranquilidade que não existe no Brasil uma "bolha" de crédito, ao contrário daquela que nos EUA precedeu a crise imobiliária.

É certo que a crise nos EUA deveu sua amplitude ao instrumento com que se financiou a expansão do crédito - ou seja, aos derivativos. Aqui, com nossas autoridades monetárias exigindo que os bancos apliquem as normas de Basileia, esse perigo não existe. Todavia, cabe perguntar se uma expansão do crédito para famílias ou empresas que não têm capacidade de honrar seus compromissos não cria o risco de aumentar a inadimplência e, especialmente, se a compra de um ativo (dólar) a um preço artificial, por causa de um excesso de liquidez, não pode favorecer uma crise.