Título: Censura insidiosa, sob aparência legal
Autor: Assunção, Moacir
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/11/2009, Nacional, p. A10
Para Batochio, a medida era clara durante a ditadura e havia como reagir, o que é mais difícil nos tempos atuais
Para o ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)José Roberto Batochio, a liberdade de imprensa é um conceito absoluto. Advogado criminalista e ex-deputado pelo PDT de São Paulo, Batochio defende a tese de que a responsabilização por eventuais abusos na mídia deve ser a posteriori - a exemplo da jurisprudência americana sobre o assunto. Em sua avaliação, é exatamente o contrário do que ocorre com o Estado desde 31 de julho, submetido a censura prévia por determinação do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF).
"A liberdade de imprensa é o mais fundamental e inalienável de todos os pilares da democracia e qualquer interpretação do texto legal, por mais torto que seja, para restringir esse direito é inconstitucional", afirmou. A segunda emenda da Constituição dos EUA veta expressamente a censura, ao deixar claro que o Congresso é proibido de criar leis que inibam a liberdade.
Assim, de acordo com Batochio, abusos devem ser punidos depois que a reportagem é publicada e não antes, o que configura censura prévia. "O Estado está sofrendo uma agressão com essa decisão. Não há democracia digna dessa acepção que possa conviver com a censura, absolutamente inaceitável sob qualquer ponto de vista." O ex-presidente da OAB ressaltou que não conhece nenhum paralelo atual de mordaça nas nações democráticas do mundo. "Isso seria impensável."
RESTRIÇÕES
Todas as tentativas estatais para regular a atividade jornalística, observa o advogado, acabaram resultando em restrições. "É por isso que defendo a liberdade total, com responsabilização civil e criminal posterior. Mesmo que se cometam abusos, esse é um risco que temos de correr, para garantir a sobrevivência da democracia."
Na avaliação de Batochio, a censura vivida pelo Estado, a partir de uma decisão judicial, tem um componente curioso em relação ao que ocorria nos tempos do regime militar. No tempo da ditadura, lembra ele, os censores instalados nas redações tinham nome e sobrenome e, até, mesmo cor. "Era verde-oliva." Hoje a mordaça adquire um aspecto que ele qualifica de "insidioso". "Ela é mais sutil e chega até a se escudar em uma aparente legalidade para praticar suas ações. Naquele período, conhecíamos o inimigo e tínhamos como reagir, o que é mais difícil hoje", comparou.
Batochio disse que, em momentos de sua trajetória como parlamentar, se sentiu injustiçado pela imprensa, mas nem por isso recorreu a tentativas de amordaçar jornais. "O comportamento abusivo, claro, não é a regra, mas a exceção. Assim, seria um absurdo imaginar que um abuso eventual levaria à proibição de um direito fundamental a toda a sociedade."
O empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), foi o responsável pelo pedido de censura ao Estado. O jornal foi proibido de publicar reportagens sobre a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, que indiciou Fernando por vários crimes.
FRASE José Roberto Batochio Ex-presidente da OAB "A liberdade de imprensa é o mais fundamental e inalienável de todos os pilares da democracia e qualquer interpretação do texto legal, por mais torto que seja, para restringir esse direito é inconstitucional"