Título: Razões humanitárias podem manter ativista no Brasil
Autor: Rosa, Vera ; Monteiro, Tânia
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/11/2009, Nacional, p. A6

Argumento será que Battisti está doente, mesma justificativa dada pelo governo francês para não entregar à Itália a militante Marina Petrella

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve manter o ativista Cesare Battisti no Brasil. O governo pretende alegar "razões humanitárias" para não extraditar Battisti, argumentando que o ex-integrante do movimento Proletários Armados pelo Comunismo (PAC) está doente. A mesma justificativa foi adotada pela França para não entregar à Itália a militante das Brigadas Vermelhas Marina Petrella.

Além disso, Battisti responde a processo penal no Brasil por falsificação de documento e uso de passaporte falso. Ele deve ficar no País até ser julgado. "A lei é clara nesse sentido e não há o que discutir", afirmou o ministro da Justiça, Tarso Genro, que disse ter ficado "surpreso" com o voto do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, favorável à extradição.

Mendes criticou o refúgio concedido por Tarso a Battisti, sob a alegação de que não se pode atribuir motivação política a "crimes de sangue". Foi enfático, ainda, ao defender a tese de que o ativista - em greve de fome para pressionar a Justiça a absolvê-lo - deveria ser condenado pelos delitos, independentemente de seus objetivos.

"Estou surpreso com esse sentimento dúbio", provocou Tarso. Para ele, o endosso à extradição de Battisti contraria a jurisprudência do STF, uma vez que outros julgamentos da corte decidiram pela concessão de refúgio a estrangeiros acusados de crimes políticos.

Lula sempre apoiou a decisão do Ministério da Justiça de abrigar Battisti. Foi convencido por amigos de que, se o ex-militante de extrema esquerda retornar à Itália, correrá risco de vida. De qualquer forma, na conversa mantida com o primeiro-ministro Silvio Berlusconi, no fim de semana, Lula não adiantou seus passos e prometeu respeitar a decisão do STF.

Foi o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, quem deu ao presidente, à noite, a notícia de que o STF resolvera dar a ele a última palavra sobre o caso. Antes mesmo desse julgamento, porém, Lula já havia afirmado que o veredicto sobre o destino do italiano era uma questão de soberania nacional. Comentou que a questão cabia ao presidente da República e a nenhum outro Poder.

BASTIDORES

Embora Tarso tenha dito que o voto de Mendes foi surpreendente, o parecer era esperado pelo Palácio do Planalto. Desde que foi criado o impasse em torno de Battisti, o governo trabalhou o tempo todo nos bastidores para construir uma saída que não desautorizasse o Ministério da Justiça. Emissários do Planalto, com trânsito no STF, foram enviados várias vezes para conversar com os juízes.

A pressão foi grande também por parte de militantes do PT e de partidos de esquerda em todo o mundo. Até mesmo na noite de terça-feira, na pré-estreia do filme Lula, o filho do Brasil - exibido na abertura do Festival de Cinema de Brasília - um grupo ocupou o palco do Teatro Nacional. Aos gritos de "justiça", o grupo estendeu uma faixa com os dizeres "Lula, liberte Cesare".