Título: Censura é um enorme desserviço à sociedade
Autor: Assunção, Moacir
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/11/2009, Nacional, p. A11
Para o desembargador José Renato Nalini, medida é um retrocesso da ordem democrática
O desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo José Renato Nalini, considera a censura ao Estado, decretada pelo TJ do Distrito Federal em 31 de julho, "um enorme desserviço à sociedade", além de retrocesso da ordem democrática. "Como poderemos garantir que a população em geral vai exercer o seu protagonismo, se ela não puder se informar do que está acontecendo?", argumentou Nalini, autor de vários livros na área de direito e presidente da Academia Paulista de Letras (APL). Ele ponderou que os governantes gostariam de não sofrer fiscalização, mas essa é uma condição essencial da existência da democracia.
O fato de um tribunal, portanto um órgão do Poder Judiciário, ter decretado a censura demonstra para o escritor que há problemas no aprendizado jurídico no País. "Sofremos de um anacronismo na formação que faz com que os juízes se enxerguem como representantes de um poder soberano estatal e não servidores públicos, portanto da sociedade", afirmou.
Os membros do Judiciário, lembrou Nalini, são os guardiães da Constituição e devem balizar suas ações pelo respeito irrestrito às normas constitucionais, totalmente contrárias à mordaça e às manifestações do poder absoluto.
"Uma decisão como esta da mordaça nos causa perplexidade. Alguém que faça isso, me parece, se sente imbuído do direito divino do monarca, como se não pudesse ser criticado. O governo não pode ser imune à fiscalização", ressaltou. Em sua opinião, pedidos de censura de veículos de comunicação poderiam até partir de governantes em início de governo, mas jamais ser acolhidos por juízes.
Estes, em sua visão, devem perceber que a Constituição representa uma espécie de pacto entre a sociedade e os Poderes constituídos, de forma que o poder constituinte é superior ao Estado e ao governo de plantão. "Os juízes são os guardiães da Constituição, mas não são os únicos e privilegiados leitores dela; que deve ser lida e observada por todos", afirmou.
Nesse prisma, a censura, em sua opinião, se configura como uma espécie de aberração legal nos dias de hoje. "Esta é uma leitura tacanha das leis. Tanto se fala de transparência, mas esta só tem valor quando é a favor?", questionou Nalini.
SUPREMO
No entanto, para ele, com o que concordam vários especialistas da área jurídica, a mordaça cairá tão logo seja submetida à apreciação do Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo Nalini, vários membros e decisões do Supremo têm demonstrado o repúdio do tribunal à mordaça."Em boa hora, o STF, por seus membros, tem dito que a censura foi banida no espírito da Constituição de 1988."
Liminar do Tribunal de Justiça do DF em ação movida por Fernando Sarney proíbe o jornal de publicar dados sobre a investigação da PF acerca de negócios do empresário, evitando assim que o "Estado" divulgue reportagens já apuradas sobre o caso