Título: Discurso de Obama não ecoa como antes
Autor: Trevisan, Claudia
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/11/2009, Internacional, p. A16

Tido como o melhor orador de sua geração, o presidente Barack Obama talvez considere o discurso sua principal ferramenta política. Esse atributo, com o qual atraiu as atenções em 2004, impulsionou-o até a Casa Branca, em 2008. Sempre que precisa acalmar temores econômicos, Obama recorre ao palanque.

Mas os limites de sua retórica ficaram evidentes no início do mês, quando não foi capaz de resgatar as candidaturas fracassadas de dois candidatos aos governos de Nova Jersey e Virgínia. Teria Obama perdido sua habilidade com as palavras? Será que a magia começou a desaparecer? Será que a Casa Branca confia demais no desempenho do presidente nos comícios para fazer avançar suas prioridades?

Pode ser cedo demais para chegar a tais conclusões. Afinal, os democratas derrotados no início do mês sofriam com seus próprios erros. Mas os resultados sugerem que, atualmente, as palavras de Obama não encontram mais o eco de antes. Se essa situação perdurar até o ano que vem, ele pode enfrentar dificuldade para implementar sua agenda política.

"Os discursos de Obama verdadeiramente inspiradores estabeleceram expectativas difíceis de atingir, e ele não correspondeu a elas", disse Michael J. Gerson, autor de discursos do presidente George W. Bush. "Ele enfrentou uma tarefa difícil ao tentar motivar o público a aceitar a reforma do sistema de saúde. Agora, confronta outro grande desafio: explicar a um país profundamente cético sua política para o Afeganistão."

CONFIANÇA

Diferentemente de Bush, que reconhecia as próprias limitações como orador, Obama e sua equipe depositam grande fé em sua capacidade de se comunicar. Quando o presidente avaliava a necessidade de resgatar a indústria automobilística e seus assessores o alertaram para uma possível reação negativa do público, Obama expressou confiança em sua capacidade de explicar a situação.

Mas David Axelrod, principal conselheiro do presidente, disse que a Casa Branca é realista. "Nunca ninguém acreditou que somente o poder da comunicação bastasse. É importante comunicar aquilo que estamos fazendo e explicar nossas motivações. Mas sem especificar o que e o porquê, a comunicação pouco vale."

Os discursos presidenciais costumavam ser muito mais raros. Eram reservados para momentos estratégicos. Atualmente, no contexto de uma mídia hiperativa, os presidentes falam ao público várias vezes ao dia. Harry Truman fez pronunciamentos 88 vezes num ano típico, Ronald Reagan fazia em média 320 discursos anuais e Clinton, 550.

O ritmo de Obama parece capaz até de superar Clinton. "Quando o orador faz quatro ou cinco discursos por dia, nenhum deles será, individualmente, o maior discurso de sua vida", disse um funcionário da Casa Branca. "Em tal ambiente midiático, o público fica facilmente distraído, parecendo que a magia se perdeu. Mas ainda há momentos em que Obama eleva o nível da retórica quando necessário."

Os assessores do presidente destacam momentos desse tipo neste ano - seu pronunciamento para defender um pacote de gastos para estimular a economia, o discurso feito no Cairo para o mundo muçulmano e o pronunciamento para defender seus planos para a reforma do sistema de saúde.

Enquanto Gerson defende que meses de discursos de Obama não acabaram com as profundas preocupações do público em relação ao seu plano para o sistema de saúde, o estrategista democrata Geoff Garin caracterizou seu discurso ao Congresso de "o melhor pronunciamento presidencial para defender suas medidas desde que o ex-presidente Lyndon Johnson discursou sobre a Lei do Sufrágio Universal, em 1965".

Após um mês dominado por ataques contra o plano para a reforma da saúde, Garin disse que Obama "conseguiu elevar a um patamar considerável um debate antes considerado atolado na lama, permitindo que os defensores da reforma retomassem a iniciativa".

Mas todos os presidentes enfrentam o risco de, em algum momento, perder a sintonia com o público. "Em 2007, o presidente Bush chegou a fazer bons discursos sobre o Iraque, mas o público já tinha deixado de prestar atenção e, assim, suas palavras caíram no vazio", disse Garin. "As pessoas ainda prestam atenção no presidente Obama. Mas será que alguém ouviu o discurso dele sobre a reforma educacional feito poucos dias atrás em Wisconsin? É claro que não."

Peter Baker é autor de livros sobre política americana e já foi correspondente no Oriente Médio e em Moscou