Título: Prevenção ao tumor ainda é falha
Autor: Leite, Fabiane
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/11/2009, Vida&, p. A24

Angelita Habr-Gama: presidente da Associação Brasileira de Prevenção ao Câncer de Intestino; professora da Faculdade de Medicina da USP defende radioterapia antes da cirurgia para tratar câncer do reto

A presidente da Associação Brasileira de Prevenção ao Câncer de Intestino, Angelita Habr-Gama, defende que a radioterapia associada à quimioterapia seja a primeira opção no tratamento de determinados tipos de câncer de reto. A estratégia reduz os tumores e pode evitar que os pacientes tenham de ser submetidos a cirurgias radicais que os obriguem a utilizar bolsas coletoras para as fezes.

Terceiro tipo de tumor mais frequente no País, estima-se que o câncer intestinal atinja 28 mil brasileiros por ano. No sábado, o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta morreu aos 63 anos vítima da doença.

Apesar de avanços, a prevenção e o tratamento na rede pública ainda são incipientes quando comparados à oferta para câncer de mama, destaca a cirurgiã, que é professora titular da Faculdade de Medicina da USP. "No câncer de intestino ainda estamos engatinhando", diz Angelita, que organizou na semana passada, em São Paulo, um fórum internacional sobre a doença. Leia trechos da entrevista.

A senhora defende nos últimos anos uma política de rastreamento para os cânceres intestinais.

O Ministério da Saúde aprovou agora a criação de um serviço na Mooca, zona leste de São Paulo, em parceria com o Hospital Oswaldo Cruz e a Prefeitura de São Paulo. Será um centro de prevenção de câncer de intestino, e a previsão é que em março já esteja atendendo o SUS. No câncer de mama já havia ocorrido muito progresso, mas no de intestino estamos engatinhando. Foi um enorme avanço conseguirmos esse centro, onde faremos colonoscopia (exame preventivo) e operações. Também servirá de exemplo: o mesmo programa será aplicado em outros bairros e, no futuro, em outros Estados. Nos últimos anos temos feitos campanhas e desenvolvemos um intestino gigante, que percorre as cidades, para falar da doença. Queremos que as entidades públicas tenham a consciência de que é mais econômico fazer prevenção e retirar um pólipo (que pode preceder a doença) do que investir nas grandes operações de câncer colorretal.

Quais são os principais avanços no tratamento nos últimos anos?

Em primeiro lugar, é importante dizer que nem tudo o que sangra é hemorroida. Sangrou (ao evacuar), vá procurar o médico. Agora, quando o paciente já tem câncer na porção mais baixa do reto, já se pode tratar, inicialmente, com radioterapia e quimioterapia - e não cirurgicamente, o que é um avanço. Assim, depois de diminuirmos o tamanho do tumor, fazemos uma avaliação para decidir se o paciente terá mesmo de ser operado. E, mesmo que a operação seja necessária, com esse procedimento anterior, é possível fazer operações que conservam as estruturas.

Então, o ideal então é quimioterapia com radioterapia.

Isso para tumores na porção final do reto. Tumores na porção alta do reto, em geral, já se opera diretamente. Mas, também nesses casos, é possível fazer operações sem cirurgias radicais. Quanto maior a redução do tumor no tratamento com radioterapia, melhor - esse é o padrão ouro.

Mas a maioria dos pacientes no País ainda chega para tratamento em estágio avançado da doença.

Mesmo os avançados podem ser tratados com radioterapia.

E os serviços públicos já conseguem fazer a radioterapia antes da operação?

Uma pesquisa que fizemos apontou que a maioria dos especialistas já faz radioterapia para câncer de reto, mas nossos equipamentos precisam realmente ser melhorados. A radioterapia evoluiu muito. Com equipamentos novos é possível fazer um tratamento bem direcionado.

A rede não tem aparelhos adequados?

Precisamos de equipamentos modernos em todo o Brasil. Quando a radioterapia não é feita com esses aparelhos, ela pode provocar lesões e queimaduras - um problema a mais para o paciente. Alguns centros têm equipamentos antigos que precisam ser modernizados. Nosso ministro e nosso governador têm consciência, mas o País é enorme e, por isso, não é fácil.