Título: Contas melhoram, mas meta fiscal de 2,5% do PIB ainda está ameaçada
Autor: Simão, Edna
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/11/2009, Economia, p. B1

Apesar de o superávit primário anual estar muito longe da meta, governo continua a adotar medidas[br]de desoneração fiscal para alguns setores, alegando que a arrecadação deverá crescer nos próximos meses

O superávit primário das contas públicas - economia feita para pagamento de juros da dívida do governo - foi o maior para um mês de outubro desde 2001. Mesmo assim, há um alto risco de o governo não cumprir a meta do superávit primário prevista para o ano, de 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB). O risco existe mesmo com as manobras contábeis feitas pelo governo, como a possibilidade de abater investimentos da meta.

Em outubro, segundo dados divulgados ontem, o governo conseguiu superávit primário de R$ 13,818 bilhões nas contas do setor público (União, Estados e municípios). Nessa conta, estão incluídas receitas atípicas, como R$ 5 bilhões em depósitos judiciais que estavam na Caixa Econômica Federal.

Por outro lado, o superávit acumulado em 12 meses voltou a cair. Em setembro, ele estava em R$ 34,7 bilhões, o correspondente a 1,17% do PIB (já bem abaixo da meta). Em outubro, o valor recuou para R$ 29,7 bilhões, ou 1% do PIB. Foi o menor valor para um período de 12 meses dos últimos oito anos.

Com a manobra de considerar investimentos como parte da economia do governo, o superávit pode ficar em até 1,56% do PIB e ainda assim a meta será considerada cumprida. O chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes, diz que o objetivo será alcançado. "A expectativa é de aumento da arrecadação nos próximos meses, a despeito das desonerações de tributos."

Apesar da queda dos resultados fiscais, o governo continua cortando impostos de alguns setores, como a redução recente do IPI de carros, móveis e materiais de construção. Para Altamir, a retomada da economia deve ajudar na recuperação da arrecadação.

Além disso, haverá ainda uma redução nas despesas em relação ao ano passado. No fim de 2008, o governo repassou receitas no valor de 0,5%do PIB para o Fundo Soberano do Brasil (FSB), o que não se repetirá neste ano. "Só com esse ajuste, conseguiríamos chegar ao final do ano com um superávit de 1,5% do PIB", aposta Altamir.

Especialistas estimam que o governo deve encerrar o ano com um superávit primário entre 1,3% a 1,6% do PIB, dependendo do comportamento da arrecadação. Uma das dificuldades para se atingir a meta de 1,56% é que não há previsão de recebimento de receitas atípicas como as de outubro.

O economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, trabalha com um superávit de 1,3% do PIB, mas não descarta o cumprimento da meta ajustada de 1,56%. "O governo tem artifícios contábeis para realizar o superávit primário. Basta usar dividendos de estatais, depósitos judiciais, como vem fazendo para fechar as contas. O problema é que são receitas extraordinárias. É preciso administrar o déficit nominal e voltar a ter superávit calcado em redução de despesas", disse Agostini.

Já o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC) e ex-diretor do BC, Carlos Thadeu de Gomes, diz que a arrecadação deve surpreender nos próximos meses. "Não será fácil atingir as metas, mas ainda há chances."

Com a queda da arrecadação neste ano, por causa da crise mundial, a economia para pagamentos de juros não tem sido suficiente para bancar as despesas. O superávit primário, por exemplo, caiu 26,22% em outubro ante o mesmo mês de 2008. Mesmo assim, a dívida pública em relação ao PIB teve ligeira redução, passando de 45% para 44,8%. Altamir estima que, no fim do ano, ficará em 44%.