Título: Acredita no aquecimento global?
Autor: Friedman, Thomas L.
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/11/2009, Vida&, p. A26

Se acompanhar o debate dos projetos de lei sobre energia e clima que estão sendo examinados no Congresso americano, você vai perceber que aqueles que se opõem à nova legislação oferecem agora dois argumentos. Um é que o globo ultimamente tem se resfriado e o outro é que os Estados Unidos não podem se permitir qualquer tipo de imposto sobre o carbono ou de um sistema de "cap-and-trade" (limitação e comércio de emissões).

Mas eles também acreditam, embora não digam, que o mundo vai enfrentar uma epidemia em massa, como a Peste Negra, que deverá eliminar 2,5 bilhões de pessoas em algum momento entre hoje e 2050. E acham que é muito melhor para os EUA se o mundo continuar dependente do petróleo - uma commodity controlada em grande parte por países que nos odeiam e que só podem elevar os preços quando a demanda cresce - e não das tecnologias de energia limpa, que nós controlamos e cujo preço só pode cair se a demanda aumentar.

E, por último, acreditam que os habitantes do mundo em desenvolvimento estão muito felizes por serem pobres - simplesmente dê a eles um pouco de água corrente e eletricidade e eles ficarão satisfeitos. Nunca desejarão viver como nós.

Sim, os que se opõem a qualquer imposto sobre o carbono para estimular o desenvolvimento de energias alternativas precisam acreditar em tudo isso porque é a única maneira de seus argumentos terem sentido. Vou explicar o porquê, mas esclarecendo primeiro como vejo essa questão.

Sou um defensor radical das energias limpas. Ser verde para mim não quer dizer apenas reciclar o lixo, mas renovar os EUA. É por isso que venho dizendo que "verde é o novo vermelho, branco e azul".

Meu raciocínio é simples. Acho que a mudança climática é um fato real. Se você não acredita, isso é problema seu. Entretanto, existem duas outras tendências fortes que têm implicações para a energia e que não podem ser negadas. E, para nós, a maneira de renovar os EUA é assumir a liderança e inventar as tecnologias para solucionar esses problemas.

A primeira é que o mundo está cada vez mais povoado. Segundo um relatório das Nações Unidas de 2006, "a população mundial sofrerá um aumento provável de 2,5 bilhões, devendo passar dos atuais 6,7 bilhões para 9,2 bilhões em 2050. Esse aumento populacional equivale à população total do mundo em 1950 e será absorvido principalmente pelas regiões menos desenvolvidas, cujo número de habitantes deve aumentar de 5,4 bilhões em 2007 para 7,9 bilhões em 2050".

As consequências, em termos de poluição, água, clima e energia, do fato de se adicionar 2,5 bilhões de bocas para alimentar, vestir, abrigar e transportar, serão assombrosas. E isso está próximo, a não ser que, como os negativistas acreditam, uma epidemia global ou um surto de abstinência em massa congele a população mundial - para sempre.

Agora, acrescente outro fato. O mundo está ficando nivelado - hoje, um número cada vez maior de pessoas pode ver como vivemos, aspiram adotar nosso estilo de vida e até conseguir nossos empregos para poderem viver como nós. Não só teremos um aumento de mais 2,5 bilhões de habitantes em 2050, mas muito mais pessoas viverão como "americanos" - com casas e carros do padrão americano, comendo enormes big macs.

"O que pode ocorrer em países em desenvolvimento com uma enorme população motorizada, que coloca nas ruas milhões de carros movidos a gasolina, quando a economia global se recuperar e não existir grande oferta global de petróleo?", questiona Felix Kramer, especialista em carros elétricos, que defende a eletrificação de toda a frota dos EUA. O que ocorre, naturalmente, é uma subida vertiginosa do preço do petróleo - exceto se desenvolvermos alternativas para ele. Os ditadores do petróleo no Irã, Venezuela e Rússia esperam que não. Eles ficarão mais ricos.

Assim, ou os oponentes de uma legislação séria sobre clima e energia que estabeleça um preço para o carbono não se importam com o fato de que poderemos ficar dependentes do petróleo e dos ditadores do petróleo para sempre ou realmente acreditam que não haverá 2,5 bilhões de pessoas a mais no mundo que desejarão viver como nós e, portanto, o preço do petróleo não vai subir muito e assim não precisamos elevar impostos para estimular o desenvolvimento de alternativas limpas e renováveis e uma economia energética.

Os falcões verdes pensam diferente. Acreditamos que, num mundo cada vez mais aquecido e mais povoado com "americanos", o próximo grande setor global será o TE - Tecnologia Energética. E que o país que inventar e instalar seu maior setor de TE desfrutará de uma maior segurança econômica, segurança energética, segurança nacional, empresas inovadoras e respeito global.

E acreditamos que esse país deve ser os EUA. Caso contrário, nossos filhos nunca alcançarão o padrão de vida que tivemos. E a melhor maneira de lançar esse novo setor é estabelecer um preço fixo, de longo prazo, para o carbono, combinadoo com o impressionante estímulo da equipe de Obama para tecnologias verdes - e deixar que o livre mercado e a inovação se ocupem do resto.

Portanto, como disse, você não acredita no aquecimento global? Então está errado, mas deixarei que você desfrute dele até a sua casa de praia ser arrastada pelas ondas. Mas, se você também não acredita que o mundo estará mais povoado, com mais pessoas aspirando a ser americanos - e que ignorar isso só ajudará a fortalecer nossos piores inimigos, enquanto que responder a isso com uma energia limpa vai contribuir para o fortalecimento das nossas melhores tecnologias -, então você está deliberadamente cego e prejudicando o futuro dos Estados Unidos.