Título: Brasil não será afetado, diz Meirelles
Autor: Leopoldo, Ricardo ; Farid, Jacqueline
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/11/2009, Economia, p. B4

Presidente do BC afirma que o Brasil já enfrentou problemas piores e não sofrerá com "oscilações de humor"

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, afirmou que bancos brasileiros não estão expostos ao conglomerado estatal Dubai World, que declarou moratória de quase US$ 60 bilhões em sua dívida anteontem. Segundo ele, as instituições nacionais não têm nenhum tipo de vinculação comercial com este conglomerado porque há "restrições da regulação prudencial brasileira". "O Brasil está preparado para enfrentar como enfrentou no passado situações muito piores", comentou ao ressaltar que o País foi bem-sucedido para sair da crise financeira internacional e tem plenas condições de superar "oscilações de humor" registradas nos mercados.

Meirelles disse ainda que "não se prevê colapso do sistema financeiro internacional" a partir do episódio envolvendo o Dubai World. "Agora, é uma situação completamente diferente. É uma situação externa a um grande mercado central", afirmou após fazer palestra durante evento em São Paulo.

Segundo o presidente do BC, autoridades regulatórias e monetárias de outros países já enviaram sinais de que o ocorrido com este conglomerado não deve provocar grande abalo no sistema financeiro dos países centrais por exposição do seus bancos àquela instituição. "São sinais, vamos aguardar os próximos dias. As previsões que temos recebido de fora são de que não se espera um colapso, muito longe daquilo que ocorreu no ano passado por razões diversas", comentou. "O fato concreto é que o ambiente hoje é de cuidado. Alguns bancos devem perder recursos nesta instituição, mas não é algo que possa lembrar episódios passados."

PROTECIONISMO CAMBIAL

A moratória em Dubai terá poucos efeitos no Brasil, segundo avalia o economista-chefe do Bradesco, Octavio de Barros.

"Possivelmente o Brasil deve sentir muito pouco, o País está sendo poupado desse tipo de estresse", disse o economista, na manhã de ontem. Para ele, "o Brasil já foi eleito pelo voto popular dos investidores do mundo inteiro, percebido como de menor risco, sem bolhas".

Pouco, mas não nada afetado, alertou o economista. "Alguns respingos sempre existem, é natural", admitiu. O economista avalia que, mais do que se preocupar com turbulências como a de Dubai, o País precisa aprender a lidar com o próprio sucesso, seja na relação com o câmbio ou no avanço das reformas.

Ele acredita que um "protecionismo cambial" está atualmente em curso no mundo, sobretudo em "cinco ou sete países" e é importante que o Brasil não siga nessa direção. "Hoje não há protecionismo comercial, mas cambial. E no Brasil estamos correndo o risco de embarcar nesse protecionismo. É a mesma face de uma mesma moeda", disse.

Segundo Octavio de Barros, a valorização do real é inevitável no momento em que a demanda no País cresce em ritmo muito mais acelerado do que a oferta e o fluxo externo de capitais "está disposto a financiar o País".

Explicando que não é "purista" na questão do câmbio, ele disse entender a preocupação do governo e do setor privado com a valorização do real. "É legítimo se preocupar, mas é preciso cautela para não colocar em dúvida um dos tripés do nosso sucesso, o câmbio flutuante", alertou. "Vamos ter que purgar esse ciclo em que há incerteza sobre o dólar no mundo."

FUGA DE INVESTIDORES

O risco de default em Dubai pode provocar uma nova fuga de investidores e nesse caso, o Brasil poderia ser prejudicado, acredita o economista Antônio Madeira, sócio da MCM consultores, em entrevista ao AE Broadcast ao vivo. "Dubai reacende a preocupação de que mais cadáveres possam surgir à frente", disse.

Segundo ele, caso não haja uma solução para o problema no emirado, o crédito pode voltar a ficar mais difícil ao redor do mundo. "Se houver mais cadáveres, isso pode segurar o ritmo de recuperação da Europa, Inglaterra e Estados Unidos. Num caso mais agudo lá fora e de aperto de liquidez, pode haver uma correção mais forte de ativos no Brasil. Por isso, é preciso cautela. No médio prazo, porém o quadro de solidez nas contas externas deve ser favorável", avaliou.

Madeira disse que o "caminho natural é de um real forte" também em 2010 e que apenas um flight to quality (voo para a qualidade) dos investidores poderia reverter isso. Essa fuga de investidores com maior aversão ao risco poderia ser causada por novos problemas em bancos ou simplesmente a descoberta de perdas já existentes, mas ainda não conhecidas. Dubai então, segundo ele, serI o gatilho para uma nova rodada de temor, caso não se encontre uma solução que evite o default.