Título: Senado questiona plano de Obama
Autor: Chacra, Gustavo
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/12/2009, Internacional, p. A14

Data para início de retirada do Afeganistão e cooperação de Karzai são pontos que não agradam aos republicanos

A estratégia para o Afeganistão do presidente dos EUA, Barack Obama, anunciada na noite de terça-feira, foi duramente questionada por parlamentares durante audiência no Senado do secretário da Defesa, Robert Gates, da secretária de Estado, Hillary Clinton, e do comandante militar, Mike Mullen. Os republicanos elogiaram a decisão de enviar 30 mil soldados - que devem desembarcar em duas ou três semanas -, mas criticaram a determinação de uma data limite de 18 meses para iniciar a retirada. No lado democrata, alguns demonstraram contrariedade com a mobilização e outros estão céticos com relação à cooperação do presidente afegão, Hamid Karzai, visto como corrupto.

O senador republicano John McCain afirmou que não há lógica em enviar e ordenar a retirada rapidamente dos soldados, apesar de concordar com o envio de mais tropas. Em resposta, Gates disse que será feita uma "reavaliação em dezembro de 2010" para determinar se os soldados começarão a ser removidos a partir de 2011.

"Mas então não faz sentido anunciar uma data. Isso dá uma impressão errada para os nossos amigos e também para os nossos inimigos", retrucou o senador, considerado uma das principais vozes em política externa do Senado.

Segundo McCain, o ideal é que as tropas iniciem a retirada quando as condições tiverem mudado definitivamente para melhor. Assim, elas podem retornar com honras.

Hillary, que seguirá para a Bélgica para convencer outros países da Otan a enviar mais tropas, reagiu e disse que o objetivo de determinar uma data para a saída é "mostrar claramente que os EUA não estão interessados em ocupar o Afeganistão ou trabalhar na construção do país". O foco, de acordo com ela e Gates, é derrotar a Al-Qaeda e o Taleban.

Mesmo dentro do partido do presidente há críticas. Para o senador democrata Carl Levin, tido como um especialista em questões militares, é arriscado enviar tantas tropas neste momento sem o número suficiente de forças de segurança no lado afegão para atuar como parceiros - um dos objetivos principais da estratégia de Obama será justamente treinar soldados e policiais do Afeganistão para que eles se tornem capazes de lidar com o Taleban no futuro.

Paul Kirk, também do Partido Democrata, disse que a estratégia falha ao depender de Karzai, acusado de fraudar as eleições presidenciais afegãs, além de "presidir uma cultura de corrupção e dependente do ópio".

Hillary defendeu o presidente afegão em sua resposta. Gates acrescentou que os ministros da Defesa e do Interior do Afeganistão são "competentes e capazes" e existem muitos "governadores bons" em províncias do país.

Obama demorou cerca de três meses para definir a sua estratégia para o Afeganistão. Diferentemente do conflito no Iraque, ele considerava, desde a sua campanha, a guerra afegã uma prioridade. O problema era conciliar isso entre as pessoas que o apoiavam e com a pressão republicana.

Além disso, havia divergências dentro de seu governo. O vice-presidente, Joe Biden, sempre se mostrou contrário à elevação do contingente no Afeganistão para quase 100 mil soldados. Em entrevista ontem a uma rede de TV americana, ele afirmou que concordou com a estratégia apenas depois de o presidente definir uma data para sair.

Já Karl Eikenberry, embaixador dos EUA em Cabul, não confia em Karzai e também acha arriscado o envio de mais tropas sem um parceiro forte no lado afegão. O principal defensor do envio é Gates, secretário da Defesa. Já Hillary, segundo analistas, é uma das poucas vozes que bancam Karzai no governo americano.

PLANO DE GUERRA

Soldados: EUA enviarão mais 30 mil soldados para o Afeganistão, aumentando para cerca de 100 mil o número de militares americanos no país

Retirada: Obama pretende começar a trazer os soldados de volta para casa em 2011, mas não fixou data para concluir a saída

Parceria: O governo afegão também deve contribuir, aumentando de 90 mil para 134 mil militares envolvidos no conflito