Título: Governo de facto culpa texto do México por crise
Autor: Simon, Roberto
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/12/2009, Internacional, p. A15

Nota mexicana que chama Zelaya de "presidente" vira justificativa de Micheletti para vetar salvo-conduto

Para o governo de facto de Honduras, a culpa pelo novo impasse envolvendo o presidente deposto, Manuel Zelaya, é do texto do pedido de salvo-conduto emitido pela diplomacia mexicana. Pelo menos foi essa a justificativa dada ao Estado por funcionários interinos. O documento, afirmam, qualifica Zelaya de "presidente" e tacitamente desconhece a legitimidade do regime imposto após o golpe - linguagem que teria provocado a ira do líder de facto Roberto Micheletti.

"A redação do pedido era absurda. Não havia nem sequer alusão ao governo hondurenho", disse uma fonte próxima a Micheletti que pediu anonimato.

Questionado, porém, sobre o que poderá fazer o regime interino ceder e autorizar a saída de Zelaya, o funcionário afirmou que "isso ainda não foi decidido".

Na nota oficial, o governo mexicano afirma ter "a honra de informar que decidiu receber em seu território o senhor presidente José Manuel Zelaya Rosales", juntamente com sua mulher, filhos e um assessor.

O regime de Micheletti não é tratado de "governo de facto", mas o documento reconhece Zelaya como presidente constitucional. "Estávamos dispostos a cooperar, mas a nota da embaixada mexicana...", completou a autoridade hondurenha.

O governo de facto já usou antes pretextos banais para camuflar motivações políticas. No auge da crise, por exemplo, o próprio Micheletti anunciou na televisão hondurenha que suspenderia o estado de sítio, mas a ordem só foi publicada cinco semanas depois, sob o argumento de que a impressora do diário oficial "estava quebrada".

Ontem, o governo Micheletti declarou que não aceitará que Zelaya receba refúgio de países fronteiriços com Honduras - portanto Guatemala, El Salvador e Nicarágua.

Segundo uma fonte do Itamaraty, o Brasil nunca foi seriamente considerado como destino do deposto por ser "muito distante, caro e ter uma língua diferente". O México seria, assim, uma espécie de escolha natural.

CONTATOS

O imbróglio do salvo-conduto ocorre num momento em que o presidente eleito, Porfírio "Pepe" Lobo, tenta uma aproximação com Zelaya para encerrar o gelo internacional imposto a Honduras. O movimento teria forte apoio da embaixada americana em Tegucigalpa.

Anteontem, ao lado do embaixador dos EUA em Honduras, Hugo Llorenz, Lobo telefonou duas vezes ao deposto. Um emissário do presidente eleito chegou a se reunir no mesmo dia com Zelaya a portas fechadas na embaixada do Brasil.

Ontem à noite, tanto Lobo quanto Zelaya confimaram que pretendiam manter uma reunião na República Dominicana - num esforço para superar a crise hondurenha.