Título: Atendimento de jovens infratores em liberdade será municipalizado
Autor: Vilicic, Filipe
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/12/2009, Metrópole, p. C1

Em SP, Estado deixará de responder pela supervisão direta de mais de 10 mil, a partir de 1.º de janeiro de 2010

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990, mudou a forma de lidar com jovens que cometem atos infracionais. Anteriormente se privilegiava a reclusão desse adolescente. Com o ECA, o foco passou a ser a recuperação social na comunidade, por meio da liberdade assistida (LA) - com supervisão de educadores. Agora o cuidado de 10 mil jovens, que cabia ao Estado, será das prefeituras. A Fundação Casa (ex-Febem), que administra 190 unidades de internação ou atendimento de adolescentes infratores no Estado, promete passar o acompanhamento deles para as cidades na virada deste ano. E, assim, adequar-se ao ECA.

Segundo o estatuto, esse trabalho deve ser realizado pelos municípios para garantir o direito à convivência familiar e à inclusão social na comunidade. Essa norma foi reafirmada no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, de 2004, e ainda visa a tornar o serviço mais individualizado - o que ajuda a convencer o jovem a abandonar a criminalidade. "É importante mostrar a um garoto que existem caminhos de sucesso em seu meio, e o crime não é a melhor escolha", defende André Alcântara, presidente de um Centro dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedeca) que atende 200 jovens em liberdade assistida de Sapopemba, na zona leste da capital. Optar pela LA, no lugar do aprisionamento, também é econômico: o Estado gasta pouco mais de R$ 100 por jovem assistido, enquanto um internado custa R$ 3 mil, em média.

"Até hoje há entidades terceirizadas que cuidam de três, quatro cidades e são coordenadas pelo Estado", admite a diretora técnica do Departamento de Proteção Social Especial da Secretaria Estadual de Assistência e Desenvolvimento Social (Seads), Fabíola Lopes. Há, porém, um esforço para mudar, que teve início em 2004. Até agora, a instituição instalou modelos de gestão em 239 das 645 cidades paulistas - muitas alternaram projetos locais com os estaduais e há aquelas, como a capital, que chegaram a conviver com os dois tipos. Desde 1º de julho, 120 prefeituras provam o protocolo tido como definitivo, que será efetivado em 1º de janeiro em todos os municípios. A Fundação Casa ainda prevê transferir a supervisão dos trabalhos para a Seads.

De acordo com a Fundação, as mudanças seriam benéficas principalmente porque os governos locais têm mais capacidade de identificar vulnerabilidades dentro de comunidades e realizar ações sociais paralelamente ao acompanhamento do infrator. "Se um garoto precisa de um abrigo, por exemplo, as prefeituras podem providenciar isso mais facilmente, uma vez que esse aparelho é de sua competência", explica o assessor de Medidas Socioeducativas da instituição, Adilson de Souza. Por outro lado, há receio de que os municípios não cumpram com os deveres. "Medidas regionais falhas aumentarão a incidência de crimes e, consequentemente, a lotação de nossas unidades de internação", diz a presidente da Fundação, Berenice Maria Giannella.

BUROCRACIA

A municipalização inclui outras mudanças. Será determinado, por exemplo, que cidades que lidem com menos de oito adolescentes não receberão verba estadual ou federal - os encargos serão só do município. Também mudará o jeito de passar o dinheiro às Prefeituras. A Fundação Casa concedia um valor por jovem atendido, que variava de R$ 100 a R$ 130 mensais. Com a municipalização, a Seads, que terá um orçamento de R$ 16,6 milhões para esse trabalho em 2010, dá o valor de acordo com o porte do município e o estágio de gestão.

Por enquanto, as prefeituras podem escolher entre receber os adolescentes infratores de forma direta, com educadores que são funcionários públicos, ou indireta, por meio de entidades conveniadas. Mas, a longo prazo os municípios paulistas terão de realizar esse trabalho sozinhos. A capital, por exemplo, onde o serviço é feito por instituições parceiras, pretende assumir o serviço só em 2012.

O Estado visitou núcleos de atendimento para ver como está a adaptação ao modelo proposto para 2010. Na capital, entidades reclamam da Prefeitura. Em Várzea Paulista, porém, o serviço é tido como exemplar. Já Barretos espera a nova medida para melhorar o atendimento na região.