Título: Hillary adverte países da América Latina sobre aproximação com Irã
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Fonte: O Estado de São Paulo, 12/12/2009, Internacional, p. A14

Secretária de Estado dos EUA diz que relação entre líderes da região com Teerã pode ter ''consequências''

A secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, classificou ontem como uma "péssima ideia" a aproximação de países da América Latina com o Irã e disse, em tom de ameaça, que se essa relação não mudar, haverá "consequências", sem especificar quais seriam. "Se querem flertar com o Irã, (esses países) devem observar cuidadosamente quais poderiam ser as consequências", disse Hillary. "Esperamos que pensem duas vezes. E, se refletirem bem, nós os apoiaremos."

De acordo com Hillary, os EUA estão cientes de que o Irã intensificou suas atividades diplomáticas na região. Como exemplo, ela citou Venezuela e Bolívia, mas não falou nada sobre o Brasil. Em novembro, o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, visitou o País e arrancou do presidente Luiz Inácio Lula da Silva algumas frases de apoio a seu programa nuclear.

Em Lima, onde acompanha Lula em visita oficial, o assessor especial da Presidência para Assuntos Exteriores, Marco Aurélio Garcia, afirmou ontem que a declaração de Hillary não se referia ao Brasil. Segundo ele, o País não busca aproximação com o Irã da mesma forma que outros países. "Não foi um recado para o Brasil. Se foi, é um recado errado", afirmou.

Ao contrário dos EUA, que romperam relações diplomáticas com o Irã após a Revolução Islâmica, em 1979, o Brasil mantém laços com Teerã desde 1903. Durante a visita de Ahmadinejad, os dois países assinaram diversos acordos bilaterais.

O presidente venezuelano, Hugo Chávez, o boliviano, Evo Morales, e o equatoriano, Rafael Correa, são insistentes críticos da política externa americana e, nos últimos meses, estreitaram seus laços com Irã e Rússia. Os comentários feitos ontem pela secretária de Estado foram até agora o mais duro recado de Washington aos líderes da região a respeito dos laços crescentes entre países latino-americanos e o governo do Irã, que é acusado pela Casa Branca de tentar desenvolver armas nucleares.

Hillary afirmou que Washington continuará manifestando sua preocupação com relação à Venezuela, onde Chávez venceu um referendo que lhe permitiu concorrer à reeleição por tempo indeterminado, e com a Nicarágua, onde a Suprema Corte abriu o caminho para que o presidente Daniel Ortega tente um novo mandato nas eleições de 2011.

"A democracia não tem a ver com líderes individuais, mas com instituições fortes. Bons líderes vêm e vão. Obviamente, tivemos nossa própria experiência neste país com isso", disse Hillary, acrescentando que Washington também espera ver em breve mudanças políticas em Cuba. "Todos esperamos que, em um futuro não muito distante, sejamos capazes de ver uma Cuba democrática, algo que seria extraordinariamente positivo para nosso hemisfério."

Hillary defendeu também a reação dos EUA ao golpe em Honduras, dizendo que Washington buscou uma "posição pragmática, íntegra e multilateral" para restaurar a democracia hondurenha.

"Queremos estar do lado do povo hondurenho e trabalhar com os países da região para resolver o problema por meio de uma união de forças", afirmou Hillary. "Eu sempre disse que os EUA sozinhos não podem resolver todos os problemas do mundo, mas que esses problemas também não podem ser resolvidos sem que os EUA estejam envolvidos. Portanto, nosso desafio é convencer os outros países a trabalhar conosco."

VISITA

O duro discurso de Hillary ocorreu às vésperas da primeira visita oficial ao Brasil de Arturo Valenzuela, subsecretário de Estado para o Hemisfério Ocidental, principal cargo do governo americano para a região. No domingo, Valenzuela começa um giro de seis dias que inclui também passagens por Argentina, Uruguai e Paraguai.

No mesmo dia em que Valenzuela chegar ao Brasil, Chávez estará em Havana para comandar uma reunião de cúpula da Aliança Bolivariana para as Américas (Alba). Caracas pretende usar o encontro para revitalizar a aliança anti-EUA na região e criticar as políticas da Casa Branca (mais informações na página 18). Fidel Castro, que não aparece em público desde julho de 2006, foi convidado para participar do encontro.

Recado

Hillary Clinton Secretária de Estado dos EUA

"Se querem flertar com o Irã, (esses países) devem observar cuidadosamente quais poderiam ser as consequências. Esperamos que pensem duas vezes. E, se refletirem bem, nos os apoiaremos"

"Todos esperamos que, em um futuro não muito distante, sejamos capazes de ver uma Cuba democrática, algo que seria extraordinariamente positivo para nosso hemisfério"

"Queremos estar do lado do povo hondurenho e trabalhar junto com os países da região para resolver o problema por meio de uma união de forças"