Título: Eleição expõe crise da Concertação
Autor: Costas, Ruth
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/12/2009, Internacional, p. A17

Há 20 anos no poder, coalizão centro-esquerdista envelhece, perde o norte ideológico e chega dividida à votação

Seja qual for o resultado das eleições chilenas de amanhã, a Concertação - coalizão de partidos de centro-esquerda que governa o país há 20 anos - estará em uma encruzilhada. A última vez que a direita conseguiu eleger um presidente no Chile foi em 1958. Agora, o conservador Sebastián Piñera é de longe o favorito no primeiro turno - e, mesmo se perder, será por margem estreita.

"Ainda que no segundo turno a esquerda consiga se unir na última hora para evitar a derrota, está cada vez mais claro que a Concertação precisará de uma reformulação completa", diz o historiador chileno Joaquín Fernandois, lembrando a derrota sofrida pela coalizão governista em outubro, nas eleições regionais - quando a esquerda perdeu 56 de seus 203 prefeitos.

A coalizão inclui socialistas, social-democratas e democratas cristãos. Foi formada em 1986 e ganhou força na campanha pelo "não", no plebiscito convocado dois anos mais tarde para decidir se Augusto Pinochet deveria permanecer no poder. O nome do movimento era "Concertação dos Partidos pelo Não". O "não" venceu por 56% a 44%.

Nas eleições de 1989, a Concertação elegeu Patricio Aylwin, com 55% dos votos, e deu início à trajetória na direção da hegemonia sobre o Legislativo e os governos locais que duraria essas duas décadas. Agora, as causas da maior crise da história da Concertação chilena estão ligadas a três fatores, segundo analistas.

O primeiro é a falta de renovação de seu quadro de líderes. Nesses 20 anos, a direita reinventou-se para livrar-se da sombra da ditadura Pinochet, limpou os resquícios de autoritarismo de seu discurso e incorporou em sua agenda a defesa de "objetivos sociais" para atrair um eleitorado mais de centro.

Já a Concertação apostou nos mesmos líderes. Seu atual candidato, Eduardo Frei, por exemplo, foi presidente entre 1996 e 2000.

O segundo fator da crise da coalizão está ligado a um certo desnorteamento ideológico, que dificulta a coesão. "De fato, cada vez mais o modelo de país defendido pela direita e pela esquerda chilena se parecem em muitos aspectos", diz o analista Eugenio Guzmán, professor da Faculdade de Governo da Universidade de Desenvolvimento, em Santiago.

Todos no Chile acreditam no benefícios da abertura e da responsabilidade fiscal e na necessidade de políticas para promover a inserção competitiva do país no mundo globalizado. A incorporação do elemento social no discurso da direita acabou por reduzir ainda mais as diferenças.

A terceira razão da crise da Concertação está relacionada à fragmentação. Nestas eleições, por exemplo, concorrem com Piñera três políticos cujas origens estão ligadas ao grupo: Frei, o socialista Jorge Arrate e o independente Marco Enríquez-Ominami. Com um discurso bastante crítico à coalizão, Ominami é sem dúvida o que mais alterou o cenário eleitoral.