Título: TRF afasta juiz De Sanctis do caso MSI-Corinthians
Autor: Macedo, Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/12/2009, Nacional, p. A8

Decisão tem caráter liminar, mas representa mais duro revés na carreira do magistrado

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF 3) ordenou ontem o imediato afastamento do juiz Fausto Martin De Sanctis do caso MSI-Corinthians. Titular da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, De Sanctis está alijado da condução de ação penal sobre a parceria entre a empresa (Media Sports Investments) e o clube paulistano, alvos de investigação por suposto esquema de lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

É a primeira vez que De Sanctis é excluído da presidência de uma ação penal em sua carreira. Trata-se do mais severo golpe já desferido contra o juiz que acumula a direção dos casos mais emblemáticos da Justiça Federal - como os processos do Banco Santos, a Operação Satiagraha e a Castelo de Areia - e, em julho de 2008, enfrentou o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, ao mandar prender duas vezes o banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity, instalando uma crise sem precedentes na magistratura.

Na ocasião, 135 juízes assinaram documento em apoio a De Sanctis, sob ameaça de investigação pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por suposta desobediência ao presidente do Supremo.

De Sanctis não se manifestou sobre seu afastamento. A decisão de tirá-lo do caso MSI-Corinthians foi tomada por unanimidade, em caráter liminar, pelos desembargadores Cecília Mello, relatora, Henrique Herkenhoff e Nelton dos Santos, todos da 2ª Turma do TRF3. Eles reconheceram a parcialidade do magistrado.

PREJULGAMENTO

Avisado por fax, o juiz interrompeu audiência do caso que presidia em seu gabinete. Naquele momento estava sendo ouvida a única testemunha de acusação, Antonio Roque Citadini, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e ex-dirigente do Corinthians, opositor ferrenho da aliança com a MSI. Ontem mesmo assumiu a direção do processo o juiz substituto Marcelo Cavalli. Novo depoimento de Citadini foi remarcado para 11 de janeiro. Também foram adiados os relatos das testemunhas de defesa, marcados para hoje e amanhã.

A medida do TRF 3 vale até que a corte coloque em julgamento duas medidas de exceção de suspeição do magistrado propostas pelos empresários Boris Abramovich Berezovsky, Kiavash Joorabchian e Nojan Bedroud - réus no processo MSI-Corinthians.

Os pedidos pelo afastamento são dos advogados criminalistas Roberto Podval e Alberto Zacharias Toron, que defendem os empresários da MSI. Eles sustentam que o juiz prejulgou a causa ao fundamentar o recebimento de denúncia criminal da Procuradoria da República. "Observa-se, a partir dos diálogos monitorados, que a suposta organização criminosa não somente se destinaria a lavar valores no futebol brasileiro, mas a praticar, em tese, toda sorte de ilícitos-tipo envolvendo este, além de lançar voos na administração pública federal", diz um trecho da decisão do juiz.

O ponto mais tenso e decisivo desse embate veio em agosto, quando De Sanctis condenou Boris e Kia ao pagamento de multa de R$ 37 mil por "litigância de má fé" de seus defensores. Toron e Podval recorreram ao STF e conseguiram anular a sentença. Eles já haviam pedido uma primeira vez a suspeição do juiz.

Em setembro do ano passado, o STF mandara anular todo o processo. Os advogados ingressaram com novas exceções de suspeição. O Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual apuraram que à sombra da parceria MSI-Corinthians atuava um magnata russo, Boris Berezovsky, dono de US$ 32 milhões investidos no time de Parque São Jorge entre 2004 e 2006. O dinheiro teria origem criminosa, segundo denúncia da Procuradoria da República. A investigação indica que a MSI se associou ao Corinthians para lavar dinheiro ilícito.

ENTENDA O CASO

Parceria suspeita

24/11/2004

O Conselho Deliberativo do Corinthians aprova parceria com a Media Sports Investiment (MSI), representada pelo iraniano Kia Joorabchian. Contrato assinado dá ao fundo de investimentos a gestão do departamento de futebol e direitos sobre licenciamento de produtos

14/2/2005

Já sob suspeita de negócios ilícitos, Kia Joorabchian depõe na Polícia Federal

23/2/2005

O procurador Roberto Porto, do Gaeco, descobriu que a MSI enviou US$ 2 milhões ao clube e o remetente seria uma empresa nas Ilhas Virgens Britânicas, a Devetia Limited. Só que o remetente constou como pessoa física, um indivíduo da Georgia

15/4/2005

O relatório final das investigações do Ministério Público de São Paulo aponta crime de lavagem de dinheiro da MSI na parceria com o Corinthians. O caso foi encaminhado para o Ministério Público Federal, que tem competência para apurar o suposto delito e denunciar os investigados à Justiça Federal

18/10/2006

Em depoimento ao delegado Protógenes Queiroz, na Polícia Federal, o então presidente do Corinthians, Alberto Dualib, e seu vice, Nesi Curi, confirmam que o iraniano Kia Joorabchian estava fora do comando da MSI e que os três investidores da parceira com o clube eram o russo Boris Berezovski, o georgiano Badri Patarkatsishvilli e o israelense Pini Zahavi. Dualib e Curi depuseram por mais de cinco horas

13/7/2007

O juiz Fausto De Sanctis aceita denúncia do Ministério Público Federal. Alberto Dualib, Nesi Curi, Renato Duprat Filho, Paulo Angioni e Alexandre Ferri são indiciados por lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Boris Berezovski, Kia Joorabchian e Nojan Bedroud têm pedido de prisão decretado

16/8/2009

O juiz Fausto Martin De Sanctis condena os empresários Boris Berezovsky e Kia Joorabchian ao pagamento de multa no valor de R$ 37,2 mil cada um porque seus advogados, Alberto Zacharias Toron e Roberto Podval, teriam praticado "litigância de má-fé". Os dois defensores haviam ingressado com exceção de suspeição do juiz, atribuindo a ele parcialidade e requerendo seu afastamento do caso MSI-Corinthians

23/8/2009

O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), manda suspender os efeitos de sentença do juiz Fausto Martin De Sanctis, que condenou os empresários Boris Berezovsky e Kia Joorabchian ao pagamento de multa de R$ 37,2 mil cada um

26/8/2009

O juiz Fausto De Sanctis afirma que não desobedeceu ao Supremo Tribunal Federal (STF) ao condenar os empresários Boris Berezovsky e Kia Joorabchian ao pagamento de multa por suposta litigância de má-fé da defesa

Ontem

De Sanctis é afastado do caso MSI-Corinthians por ordem do Tribunal Regional Federal