Título: O prazo das concessões
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/12/2009, Notas e informações, p. A3

Sem informar os critérios que deverão ser adotados para renovar ? ou reverter para o Estado ? as concessões de exploração de usinas hidrelétricas e distribuidoras de energia ? há 62 vencendo entre 2015 e 2017 ?, o governo federal gera incertezas entre investidores e consumidores de eletricidade. Dúvidas semelhantes já custaram caro ao governo paulista, obrigado a interromper o processo de privatização das Usinas de Jupiá e de Ilha Solteira.

No conjunto, as usinas cujas concessões estão vencendo geram 21,7 mil MW, cerca de 20% da capacidade total do sistema elétrico nacional. Entre as maiores estão as hidrelétricas da Cesp, estatal controlada pelo governo paulista, e as da Chesf, controlada pela Eletrobrás.

A Cesp tem capacidade total de geração de 7.456 MW ? e as usinas cujas concessões vencerão na próxima década respondem por mais de 60% dessa capacidade. O risco de perda da concessão é admitido nas informações para os acionistas divulgadas no site da Cesp: "As concessões, ao amparo das quais a companhia está autorizada a gerar energia elétrica a partir de suas diversas usinas hidrelétricas, poderão não ser renovadas e a indenização a ser paga em decorrência da extinção da concessão pela reversão dos bens vinculados à geração de energia, caso existente, poderá não ser suficiente para evitar os efeitos relevantes adversos à Cesp, seus resultados e situação financeira."

A capacidade de geração de energia da Chesf é ainda maior: 10,6 mil MW. E 90% desse total está sujeito à caducidade das concessões, na próxima década. Entre os maiores aproveitamentos hídricos da Chesf estão as Usinas de Paulo Afonso, com capacidade instalada de 4,279 mil MW; Xingó, com 3,162 mil MW; Luiz Gonzaga, com 1,479 mil MW; e Sobradinho, com 1,050 mil MW.

Além das concessões da Cesp e da Chesf, outras de grande porte, como Furnas, também estão ameaçadas ? e o governo federal parece disposto a deixar para a próxima administração a solução do problema. Trata-se, na verdade, de um fator de perturbação do mercado, pois o planejamento do setor elétrico tem de ser feito com grande antecedência, inclusive no caso de empreendimentos antigos, que precisam de recursos para manutenção e modernização.

Ainda que o governo opte por reverter as concessões para a União, para posterior licitação, não são pequenos os riscos do adiamento das decisões, afirmaram os especialistas Adriano Pires e Abel Holtz, em artigo publicado no Estado.

O primeiro risco é o do "abandono da concessão" pelos atuais concessionários, por insegurança dos investidores de que continuarão à frente do negócio. Por razões semelhantes, há o risco do sucateamento dos ativos elétricos, "sem a possibilidade de fiscalização, dada a grande dispersão das concessões". O terceiro risco é de "o governo criar uma estatal específica para administrar os ativos revertidos até a sua licitação". Esta hipótese, segundo os autores, poderá até "se tornar definitiva, dada a atual vertente intervencionista do governo no setor de energia".

Desde 2008, com a Lei 11.651, o ambiente está pronto para um aumento do peso do Estado no setor. Com a lei, a Eletrobrás ? a holding de energia do governo federal ? pode ser sócia majoritária nos consórcios que disputem concessões de energia.

Qualquer que seja a decisão relativa às usinas cujas concessões estão vencendo, ela terá de ser adotada após a definição clara das regras de avaliação dos ativos, do levantamento minucioso relativo a cada concessão, da estimativa dos investimentos feitos pelos concessionários e sua necessária amortização. Isto exige pessoal qualificado, capaz e em número suficiente, o que já se põe em dúvida que exista, hoje, pela falta de recursos da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Os controladores das usinas poderão concordar com as avaliações ou entrar em litígio contra o Estado. O Tribunal de Contas da União terá de ser ouvido. E será preciso definir até o destino dos empregados das usinas.

A importância das concessões não parece estar sendo levada na devida conta pelo Ministério de Minas e Energia. Recomenda-se a discussão prévia do tema com os controladores e consumidores. O custo do adiamento das decisões poderá ser muito elevado.